terça-feira, 27 de março de 2012

GESTANTE NO EXAME DEMISSIONAL: ESTÁ APTA OU INAPTA?

Prezados leitores.

Imaginemos a seguinte situação: gestante de 28 semanas (aproximadamente 6 meses e meio), dentro de sua normalidade clínica, e com pré-natal sendo feito de forma correta. Ela está sendo dispensada (sem justa causa) da empresa onde trabalhava na função de “auxiliar administrativa”. Em seu exame demissional, será considerada “apta” ou “inapta” pelo Médico do Trabalho / Médico Examinador? Entendemos que ela deverá ser considerada “apta”, pelos fundamentos que passamos a expor.

O item 7.4.1 da Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7), assim nos traz:

“O PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) deve incluir, entre outros, a realização obrigatória dos exames médicos:

a) admissional;
b) periódico;
c) de retorno ao trabalho;
d) de mudança de função;
e) demissional.”

Não nos parece razoável admitir que haja critérios médicos distintos quando da realização de cada um dos exames acima. Ou seja, em regra, o critério a ser usado no exame admissional deverá ser o mesmo usado no exame demissional, periódico, etc. Por quê? Pelo simples risco de haver uma conduta discriminatória por parte do médico que realiza tais exames com análises diferenciadas em cada um deles. Não cabe, dentro do campo da saúde do trabalhador, “dois pesos e duas medidas”. Ou o exame é completo, ou é incompleto, seja ele admissional, periódico, demissional, etc.

Na mesma esteira, assim coloca o item 7.4.4.3, alínea “e” da Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7):

“O ASO deverá conter no mínimo: definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu.”

Interpretando: seja para a função que o trabalhador vai exercer (no exame “admissional”, no de “retorno ao trabalho” e no de “mudança de função”), exerce (no exame “periódico”), ou exerceu (no exame “demissional”), o ASO (Atestado de Saúde Ocupacional) terá a mesma conclusão mínima: “apto” ou “inapto”.  Repousamos nosso entendimento no sentido de que: se as conclusões possíveis são as mesmas, os critérios que levam a essas possíveis conclusões também devem ser os mesmos.  

Partindo desse princípio, refazemos a pergunta inicial desse tópico, substituindo “exame demissional” por “exame admissional”: gestante de 28 semanas (aproximadamente 6 meses e meio), dentro da normalidade clínica, e com pré-natal sendo feito de forma correta. Ela está sendo admitida numa empresa na função de “auxiliar administrativa”. Em seu exame admissional, será considerada “apta” ou “inapta” pelo Médico do Trabalho / Médico Examinador? Ora, sendo verificada a compatibilidade dela com o posto de trabalho que a recepcionará, dúvidas não restam de que ela estaria “apta”, nos termos da fundamentação abaixo:

 “É obrigação do Médico do Trabalho, no exame admissional, compatibilizar aptidão do candidato, do ponto de vista médico, ao posto de trabalho.” (Código de Conduta do Médico do Trabalho. ANAMT, 2003.)

Se a análise dos exames deve ser a mesma para que não se configure uma conduta discriminatória em suas abordagens, estando “apta” no exame admissional, essa gestante também deverá ser considerada “apta” no exame demissional.

Além disso, se, como médicos, qualificássemos essa trabalhadora como “inapta” no exame demissional, a conduta natural seguinte seria encaminhá-la ao serviço de perícias médicas do INSS, no sentido de tentar lhe garantir o auxílio-doença previdenciário (código 31), enquanto estivesse incapaz de exercer suas atividades laborais. Esse benefício, provavelmente lhe seria negado, pois o Médico Perito do INSS não encontraria nenhuma incapacidade ao trabalho nessa paciente, que justificasse o recebimento do auxílio-doença, com toda razão.

Aliás, sempre que houver dúvida em um exame demissional quanto à aptidão ou inaptidão de qualquer trabalhador, recomendamos aos Médicos do Trabalho / "Médicos Examinadores" que avaliem a mesma situação como se fosse um exame admissional. Normalmente a análise fica mais simplificada (e justa) dessa forma.

Por que de tanta polêmica no caso da gestante? Vejamos o que diz o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 10, inciso II, item b: 

“Fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”

É incontestável o direito da estabilidade provisória à uma empregada gestante, nos termos constitucionais expostos. No entanto, essa é uma questão administrativa, que se resolve entre essa trabalhadora e a empresa. A função do Médico do Trabalho/”Médico Examinador”, no exame demissional, é qualificá-la, no mínimo, como “apta” ou “inapta” para a função específica que ela exerceu, nos termos do item 7.4.1 da NR-7. Tudo que extrapolar essa análise é uma questão a ser resolvida pelos outros atores envolvidos, e não pelo médico da empresa.

Obviamente que numa situação de exame demissional de uma trabalhadora gestante, para evitar transtornos futuros, convém que o Médico do Trabalho/”Médico Examinador” comunique à empresa sobre a gestação dessa empregada (após expresso consentimento da trabalhadora – o que, nesse caso, normalmente não é de difícil obtenção), e sobre a possibilidade de ter que reintegrá-la posteriormente, uma vez que isso é um direito consagrado dessa empregada gestante.  O mesmo raciocínio teve o Tribunal Superior do Trabalho (TST) em repetidos julgados:

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. EMPREGADA GESTANTE. GARANTIA AO EMPREGO. 1. Na dicção do c. TST, prescindível a ciência prévia da empresa sobre o estado gravídico da empregada, para a aquisição do direito à garantia tratada no art. 10, inciso II, alínea b, do ADCT (OJSBDI 1 nº 88). 2. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR- 464450-95.1998.5.02.5555)

EMENTA: “RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DO ART. 10, II, "B", DO ADCT / CF / 88. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. DESCONHECIMENTO DA GRAVIDEZ PELO EMPREGADOR. O artigo 10, inciso II, do ADCT não impôs qualquer condição à proteção da empregada gestante. Assim, o desconhecimento da gravidez, pelo empregador, no momento da despedida imotivada não constitui obstáculo para o reconhecimento da estabilidade constitucional. Dessa forma, viola o texto constitucional a decisão que não reconhece a estabilidade da empregada gestante em virtude do desconhecimento da gravidez pelo empregador no ato da sua demissão.” (ROAR 400356/1997)

Ainda em tempo, pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 10, inciso II, item b, cabe-nos ressaltar que só faz jus a estabilidade provisória, a empregada gestante dispensada arbitrariamente, ou seja, sem justa causa.

Que Deus nos abençoe.

Um forte abraço a todos.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

terça-feira, 20 de março de 2012

ASSISTENTE TÉCNICO PODE SER O PRÓPRIO MÉDICO DA EMPRESA?

Prezados leitores.

Com o advento da Resolução n. 1.488/1998 do CFM (Conselho Federal de Medicina), muitas polêmicas têm sido levantadas naquilo que tange à atuação do Médico do Trabalho como assistente técnico, em processos judiciais, para empresas nas quais presta (ou prestou) serviços. À luz da legislação em vigor, (não) pode ou (não) deve o médico do trabalho fazer essa atuação?

O art. 12 da Resolução n. 1.488/1998 assim nos traz:

“O médico de empresa, o médico responsável por qualquer Programa de Controle de Saúde Ocupacional de Empresa e o médico participante do Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho, não podem ser peritos judiciais, securitários ou previdenciários, ou assistentes técnicos da empresa, nos casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos (atuais ou passados).” (Redação dada pela Resolução n. 1.810/2006 do CFM)

Na mesma linha, vem o Parecer do CRM-RN n. 004/2010:

EMENTA: “Comete ilicitude ética o médico do trabalho que atua como assistente técnico indicado pela empresa com a qual mantém qualquer vínculo.”

No entanto, o Código de Processo Civil, em seu art. 422, assim coloca: “os assistentes técnicos são de confiança da parte, não sujeitos a impedimento ou suspeição”. Tal redação foi dada pela Lei n. 8.455/1992.

Verifica-se, aqui, o que no estudo do Direito recebe o nome de antinomia, ou seja, a presença de duas normas conflitantes, gerando dúvidas sobre qual delas deverá ser aplicada ao caso singular. Para solucionar esse conflito de normas, a doutrina jurídica apresenta algumas alternativas, avaliadas sucessivamente: (a) critério hierárquico (norma superior revoga a inferior); (b) critério da especialidade (norma especial revoga norma geral); (c) critério cronológico (norma posterior revoga norma anterior). Juridicamente (e não administrativamente, em nível de sindicâncias nos CRMs), no caso em tela, a Lei n. 8.455/1992 goza de uma posição hierárquica privilegiada ante a Resolução n. 1.488/1998 do CFM, uma vez que se classifica como Lei Ordinária, enquanto a última, como Ato Administrativo (norma hierarquicamente inferior quando comparada a uma Lei Ordinária) de um ente da administração pública indireta (trata-se de uma Resolução do Conselho Federal de Medicina).

É sabido, entretanto, que os CRMs (Conselhos Regionais de Medicina), balizados pelas Resoluções do CFM, possuem a prerrogativa de penalizar os médicos pelas infrações éticas eventualmente cometidas. Sendo assim, não obstante a maior força jurídica hierárquica da Lei n. 8.455/1992 diante das Resoluções do CFM, para efeito administrativo, muitos Médicos do Trabalho ainda têm sido penalizados em seus conselhos por atuarem como assistentes técnicos de empresas para as quais prestam/prestaram serviços, com base na Resolução n. 1.488/1998. Na óptica jurídica, tal atitude dos conselhos é ilegal, se não vejamos:

“Normas inferiores não podem inovar ou contrariar normas superiores, mas unicamente complementá-las e explicá-las, sob pena de exceder suas competências materiais, incorrendo em ilegalidade.” (Supremo Tribunal Federal — Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.398. Relator Ministro Cezar Peluso, julgado em 25/06/2007)

Tanto assim que, por ordens judiciais, o art. 12 da Resolução n. 1.488/1998 (que tem a redação dada pela Resolução n. 1.810/2006) já não tem aplicação para várias empresas (ex.: Funasa, Copel, Transpetro e Codesa). Isto é, para essas instituições, seus respectivos Médicos do Trabalho estão “liberados” para atuarem como assistentes técnicos nos processos judiciais que as envolvam. Numa das decisões judiciais, o magistrado assim sentenciou:

“Ante o exposto, concedo a segurança para, confirmando a liminar, tornar definitiva a determinação de não-aplicação da Resolução CFM nº 1.810/2006, a quaisquer médicos empregados das impetrantes, permitindo a sua atuação como assistentes técnicos das impetrantes em processos judiciais, vedada a abertura de qualquer tipo de processo ético-disciplinar em relação a esses médicos empregados em virtude da simples assunção dessa função de assistente técnico em processo judicial.” (Processo 2007.34.00.032067-4)

Percebemos então, que a manutenção dessa visão condenatória por parte dos CRMs deixa os próprios conselhos vulneráveis à futuras indenizações por danos morais, pleiteadas juridicamente pelos próprios Médicos do Trabalho que eventualmente vierem a ser penalizados administrativamente.

Todavia, a interpretação coerente dos arts. 93 e 94 do novo Código de Ética Médica parece esclarecer definitivamente tal questão, dando mais autonomia aos Médicos do Trabalho, e protegendo assim os próprios conselhos de indenizações desnecessárias, senão vejamos:

“Art. 93. É vedado ao médico ser perito ou auditor do próprio paciente, de pessoa de sua família ou de qualquer outra com a qual tenha relações capazes de influir em seu trabalho ou de empresa em que atue ou tenha atuado.”

Obs.: percebemos que esse artigo excluiu a figura do assistente técnico para atuação junto às empresas.

“Art. 94. é vedado ao médico intervir, quando em função de auditor, assistente técnico ou perito, nos atos profissionais de outro médico, ou fazer qualquer apreciação em presença do examinado, reservando suas observações para o relatório.”

Obs.: percebemos que esse artigo não excluiu a figura do assistente técnico, mostrando que não houve omissão ou esquecimento na redação do art. 93.

Importante ressaltar que o novo Código de Ética Médica, em seu art. 3º, revoga todas as disposições contrárias ao próprio código, o que, segundo nosso entendimento, também inclui o art. 12 da Resolução n. 1.488/1998.

Concluindo, à luz de toda a legislação vigente, incluindo o novo Código de Ética Médica, entendemos que o Médico do Trabalho pode sim atuar como assistente técnico para empresa na qual presta/prestou serviços, valendo-se, para aceitação do nobre encargo, apenas dos ditames de sua consciência. No entanto, apesar da permissividade legal constatada, sugerimos que tal mister deva ser elegantemente recusado para que não se coloque em risco a credibilidade e necessária imparcialidade que o Médico do Trabalho deve ter, tanto perante os gestores da empresa, quanto perante os próprios empregados.

Um forte abraço a todos.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

CURSO: PERÍCIAS MÉDICAS NA JUSTIÇA DO TRABALHO.

Prezados colegas médicos, e acadêmicos de Medicina.

Abaixo, mais uma boa oportunidade de encontro que teremos.

Sintam-se convidados!

Um forte abraço a todos.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha


segunda-feira, 19 de março de 2012

REVALIDAÇÃO DE TÍTULO DE ESPECIALISTA NÃO É MAIS NECESSÁRIA.

Prezados colegas médicos.

Lembram-se daquela regra de que os títulos de especialista emitidos a partir de 2006 deveriam ser "revalidados" de 5 em 5 anos?

Lembram-se da Comissão Nacional de Acreditação (CNA) da Associação Médica Brasileira (AMB) que atribuia pontos à congressos e eventos médicos?

Pois é... nada disso existe mais. Tudo é passado!

Pelo menos é o que estabelece a Resolução do CFM 1984/2012 (publicada no Diário Oficial da União em 14/03/2012, e muito pouco divulgada até agora), confiram:

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

CURSO EM MACEIÓ.

Prezados leitores.

Sintam-se convidados para essa boa oportunidade de trocarmos informações, e aprendermos juntos um pouquinho mais sobre esse tão importante tema.

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha


terça-feira, 13 de março de 2012

DEPENDENTE QUÍMICO TEM ESTABILIDADE NO EMPREGO?



Juíza considera discriminatória dispensa de dependente químico

“Se, por um lado, o empregador tem o direito de dispensar o empregado imotivadamente, por outro, o Judiciário tem o dever de reprimir atos abusivos ou discriminatórios no âmbito da relação de emprego. Cabe ao juiz analisar cada caso com sensibilidade, observando as nuances e sutilezas, a fim de alcançar a solução mais justa no caso concreto. A reflexão foi feita pela juíza Ângela Castilho Rogedo Ribeiro, titular da Vara do Trabalho de Ponte Nova, ao julgar o caso de um viciado em crack, dispensado por justa causa, sob a alegação de abandono de emprego. No entendimento da magistrada, a dispensa foi discriminatória.

A reclamada alegou que não sabia que o reclamante era dependente químico e que a justa causa foi aplicada porque ele abandonou o emprego. Mas a tese não convenceu a julgadora. Aplicando o princípio da continuidade da relação de emprego, ela explicou que o empregador deve provar de forma inequívoca que o término do contrato se deu por iniciativa do empregado ou em razão de falta grave por ele cometida. No caso do processo, a ré não conseguiu provar a falta grave. É que o reclamante não chegou a faltar ao emprego por 30 dias corridos, nem demonstrou intenção de deixar o emprego. Como observou a magistrada, a própria reclamada admitiu que o reclamante compareceu poucos dias antes da dispensa para dizer que estava com problemas particulares, sem previsão de retorno ao trabalho. Isso demonstra que ele não tinha a intenção de deixar o emprego. Por essa razão, a juíza sentenciante decidiu declarar nula a justa causa aplicada.

Após analisar as provas com a cautela que o caso merece, a magistrada se convenceu ainda de que a dispensa foi discriminatória. Ela constatou facilmente, pela aparência do reclamante na audiência, que se tratava de um dependente químico. ‘Dos atestados médicos juntados, depreende-se que o autor é viciado em substância psicoativa, o que, registro, é visível aos olhos de qualquer pessoa leiga de bom senso’, fez constar na sentença. Para a juíza, ficou evidente que as faltas ao trabalho tinham relação direta com o vício. Prova em sentido contrário deveria ter sido apresentada pela empresa, mas não foi. A total frieza e indiferença demonstradas pela reclamada na audiência de instrução, diante da triste situação do reclamante, também chamaram a atenção da magistrada. Uma atitude que ela classificou como reprovável e lamentável. A conduta revelou uma discriminação velada. ‘Uma das piores formas de discriminação é a indiferença’, registrou.

Para a julgadora, a empregadora não poderia simplesmente descartar o trabalhador do seu empreendimento, ignorando seu estado de saúde. Ao agir assim, deixou de cumprir sua função social. ‘A reclamada simplesmente fechou os olhos à realidade de seu empregado e o lançou à própria sorte, esquecendo-se de que toda e qualquer empresa deve observância ao princípio da função social, segundo o qual a empresa não é apenas fonte de lucro, mas também fonte de práticas sociais que favoreçam o meio no qual está inserida’, frisou.

A magistrada também relembrou que, infelizmente, as discriminações veladas são uma realidade nas relações de trabalho. Dentre suas vítimas, destacou os portadores de HIV, os portadores de deficiência e aqueles que, de alguma forma, tiveram sua força de trabalho diminuída por alguma doença ou patologia. Nesse último grupo, incluiu os conhecidos ‘viciados em drogas’. A juíza sentenciante registrou que a discriminação persiste porque ainda prevalece a ideia, ou preconceito, de que o viciado apresenta um desvio de caráter. Mas isso vem mudando, segundo ela, e, aos poucos, a questão passa a ser tratada como a doença que de fato é, um problema de saúde pública. A julgadora ponderou que se se tratasse, simplesmente, de ‘desvio de caráter’ o Estado não teria excluído a pena privativa de liberdade para os usuários de drogas.

‘Considerada a ordem constitucional vigente - que consagra o ser humano como o principal destinatário da ordem jurídica, impõe-se a adoção - por parte de todos o integrantes da coletividade - de toda e qualquer medida capaz de impedir que um ser humano acresça a escória da humanidade. Neste intuito, o papel das empresas é de extrema relevância, porque é fácil vislumbrar que, estando desempregado, o dependente químico tem maior probabilidade de ceder ao vício, lançando-se às margens da cidadania’, registrou a juíza.

Por fim, a magistrada frisou que a vida e a integridade física são os bens supremos das pessoas. Por isso, a responsabilidade da empresa em relação ao usuário de crack, caso do processo, é objetiva, ou seja, pouco importa que a reclamada soubesse ou não do vício do empregado. E fez uma analogia: Assim como a empregada gestante tem estabilidade no emprego desde a concepção até 05 meses após o parto, independentemente de o empregador ter ou não conhecimento da gravidez - tudo em prol da proteção à vida, também o empregado viciado em crack possui o direito de não ter seu contrato de trabalho extinto durante todo o período que se fizer necessário para a sua recuperação’.

Com esses fundamentos, a sentença determinou a reintegração do reclamante, em função compatível com sua atual condição, e, após a reintegração, o encaminhamento ao INSS para o devido tratamento. A empresa não recorreu da decisão.”

Processo nº 00351-2011-074-03-00-1.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3a Região.

Link direito para matéria: http://bit.ly/wa3Le7

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

segunda-feira, 12 de março de 2012

DOENÇA NÃO RELACIONADA AO TRABALHO GERA ESTABILIDADE?

Quer saber mais sobre segurança e saúde no trabalho?

Dias 14 e 15 de novembro - em São Paulo/SP.


Veja a programação completa através do link: www.congressomedicina.com.br

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Prezados leitores.

Quando o assunto é estabilidade no emprego em virtude de alguma doença, logo nos vem à memória a redação do art. 118 da Lei 8.213/1991:

“O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente da percepção de auxílio-acidente.”

Conforme nos ensina o art. 20 da mesma lei, o acidente do trabalho equipara-se à doença ocupacional. Sendo assim, o empregado acometido por alguma doença relacionada ao trabalho também tem a prerrogativa do gozo da estabilidade mínima de 12 meses, após cessação de seu auxílio-doença acidentário. É o que nos confirma o inciso II da Súmula 378 do TST:

São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.” 

E quando a doença não é ocupacional: terá o empregado direito a alguma estabilidade quando de sua dispensa do trabalho?

A dispensa arbitrária (sem justa causa) é permitida em nossa legislação, baseada no direito que o empregador tem, assegurado constitucionalmente, da livre iniciativa, e do exercício do seu poder potestativo (poder que o empregador tem de “escolher com quem quer trabalhar”).

Mas, se por um lado a CF/1988 dá ao empregador a possibilidade deste contratar (e descontratar) quem quiser, e quando quiser; a mesma CF/1988 dá garantias fundamentais a cada cidadão brasileiro, tais como: preservação da intimidade, da liberdade de expressão, da igualdade, da dignidade da pessoa humana, etc.

E quando a CF/1988 for contrária à própria CF/1988? Ou seja, e quando o poder potestativo do empregador (de contratar e descontratar quem quiser, e quando quiser) ofender a alguma garantia fundamental do cidadão, como por exemplo, à preservação da igualdade, ou da dignidade da pessoa humana?

Vejamos alguns exemplos desses casos.

1) Suponhamos um excelente professor de uma escola de ensino médio. Nas horas vagas, este professor escreve poesias eróticas e alimenta um blog pessoal com tais poesias. A escola poderia dispensá-lo do emprego por esse motivo, ou haveria aí uma afronta à garantia constitucional da liberdade de expressão desse professor?

2) Um empregado é HIV positivo. Ao revelar isso na empresa, esse empregado é dispensado do trabalho. Houve lesão à preservação da igualdade estabelecida na CF/1988, ou seja, houve discriminação?

3) Um trabalhador é dispensado em virtude de uma doença crônica não ocupacional (por exemplo, câncer). Há lesão ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana?

Todos os exemplos citados confrontam os direitos fundamentais e constitucionais do empregador e do empregado. Qual deve prevalecer? O juiz decidirá.

Nesse contexto, uma doença não ocupacional também poderá gerar estabilidade. Senão, vejamos os julgados a seguir:

     a)  Processo 0000467-07.2010.5.04.0611. Nesse caso, o empregador dispensou (sem justa causa) um empregado HIV positivo (cuja contaminação não tinha nenhuma relação com o trabalho), pouco mais de uma semana após ter ciência do diagnóstico do trabalhador. Como a contaminação com o vírus HIV não foi em virtude do trabalho, teoricamente esse empregado não gozava de estabilidade, nos termos do art. 118 da Lei 8.213/1991. No entanto, o empregador foi condenado a indenizar esse trabalhador em R$ 8.000,00 (oito mil reais) por danos morais em virtude da afronta à garantia constitucional da igualdade.

b)  Processo 810404-10.2001.5.12.5555. Aqui, o empregado comunicou à empresa que faria uma cirurgia corretiva de hérnia inguinal (nesse caso, considerada doença não ocupacional), e que depois da cirurgia teria que ficar afastado do trabalho por alguns dias visando sua própria recuperação. Após o comunicado, e antes que a cirurgia ocorresse, o empregador dispensou o empregado (sem justa causa), uma vez que esse empregado não gozava de estabilidade. Resultado: a empresa foi condenada a pagar o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por danos morais em virtude da afronta ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, mesmo diante de uma doença não relacionada ao trabalho.

c)  Processo 165140-46.2006.5.01.0027. No caso em tela, após a cessação do auxílio-doença previdenciário do INSS (código 31), um empregado portador de cirrose (considerada como doença não ocupacional) foi dispensado do emprego, uma vez que foi considerado "apto", e legalmente não gozava de estabilidade. Por ordem judicial, a empresa foi obrigada a reintegrá-lo, por afronta ao direitos fundamentais da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

d) Processo 49/2006-046-02-40.7. Nesse caso, o empregador dispensou um empregado acometido por câncer (aqui considerada uma doença não ocupacional). O Tribunal Superior do Trabalho (TST) foi enfático: “o trabalhador comprovadamente portador de doença grave não pode ter seu contrato rompido, esteja ou não afastado previdenciariamente do serviço, uma vez que a manutenção da atividade laborativa, em certos casos, é parte integrante do próprio tratamento médico”. Além disso, o TST qualificou a atitude da empresa como discriminatória. Consequência: o empregado foi reintegrado ao trabalho.

e) Processo RR - 105500-32.2008.5.04.0101. Aqui, a uma empresa que atua no ramo de hipermercados teve que reintegrar um ex-empregado, portador de esquizofrenia (doença não ocupacional), dispensado sem justa causa logo após ter ficado afastado do trabalho, recebendo auxílio-doença do INSS, para tratamento médico. A decisão, que considerou a dispensa arbitrária e discriminatória (pois se deu após a empresa ter ciência de que o empregado possuia enfermidade ligada ao uso de drogas), prevaleceu em todas as instâncias judiciais, inclusive no TST.

f) Processo 00351-2011-074-03-00-1. Nessa ação, a empresa dispensou um empregado (motorista) dependente de crack, sob o argumento de abandono de emprego (uma justa causa de rescisão de contrato de trabalho, conforme art. 482 da CLT). A magistrada qualificou a atitude do empregador como discriminatória. E foi além: "assim como a empregada gestante tem estabilidade no emprego desde a concepção até 5 meses após o parto, independente de o empregador ter o não o conhecimento da gravidez, tudo em prol da proteção à vida, também o empregado viciado em crack possui o direito de não ter seu contrato de trabalho extinto durante todo período que se fizer necessário para sua recuperação". Com esses argumentos, a juíza determinou a reintegração do empregado em uma função compatível com seu estado, e o encaminhamento ao INSS para devido tratamento. 


g) Processo RO 0001417-69.2010.5.01.0491. Aqui, uma empregada de uma clínica de nefrologia, portadora de Hepatite C, foi dispensada ainda no período de experiência. Ao ser contratada em 01º/05/2010 para a função de técnica de enfermagem, a trabalhadora realizou exame admissional, sendo considerada apta para o trabalho. Após o resultado do exame de sangue revelar a existência da enfermidade, a clínica solicitou novo exame, que ratificou o diagnóstico em 18/05/2010, sendo a empregada dispensada no dia seguinte, menos de 20 dias depois da contratação. Além da condenação por dano moral, o juiz da 1ª Vara do Trabalho de Magé/RJ declarou a nulidade da dispensa da trabalhadora, por entendê-la discriminatória, e determinou sua reintegração no emprego.
h) Processo AIRR-12635-31.2010.5.04.0000. No caso em tela, temos uma situação frontalmente oposta ao exemplo anterior, o que mostra que ainda não temos posicionamentos pacificados nos tribunais, no que se refere à essa matéria. Vejamos: uma ex-diretora de uma fundação, portadora de transtorno afetivo bipolar foi dispensada do emprego. Por ter gozado de auxílio-doença (não acidentário), ajuizou uma ação trabalhista alegando que sua doença era ocupacional, e que sua dispensa da empresa caracterizava uma atitude discriminatória, pedindo assim indenização. A perícia médica judicial concluiu pela ausência do nexo de (con)causalidade entre o transtorno afetivo bipolar e o trabalho da ex-diretora. O TST não reconheceu existência de doença ocupacional que justificasse a indenização, “embora a doença a tornasse incapaz para o trabalho”. Entendeu ainda a Egrégia Corte, que a dispensa não foi discriminatória, e absolveu a fundação.

Por todo exposto, enquanto permanecer a discórdia de entendimentos entre os julgadores no que tange a esse assunto, devemos considerar que, independente de serem (ou não) doenças ocupacionais, as doenças crônicas consideradas graves podem garantir ao trabalhador estabilidade no emprego, apesar de não haver lei em vigor que imponha isso de forma específica. Quando de uma dispensa de um empregado, o empregador deverá estar atento e vigilante para que não haja possibilidade de afronta, especialmente aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, e da igualdade (não discriminação) dos cidadãos/trabalhadores.

Concluindo, é dado constitucionalmente ao empregador o poder potestativo, ou seja, o poder de contratar e descontratar quem quiser, e quando quiser.   No entanto, se ao dispensar algum empregado, houver questionamento judicial de que houve lesão de alguma garantia fundamental do cidadão estabelecida na mesma CF/1988 (ex.: intimidade, liberdade de expressão, igualdade, dignidade da pessoa humana, etc.), a reintegração ao emprego (e alguma indenização) poderá ser pleiteada.

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

terça-feira, 6 de março de 2012

ACIDENTE DE TRABALHO NO CONTRATO DE EXPERIÊNCIA GERA ESTABILIDADE?

Prezados leitores.

Sabemos que a empregada gestante goza de estabilidade provisória no emprego, conforme nos ensina o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 10, inciso II, item b: 

“Fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”

No entanto, há ressalvas para que a gestante faça jus a essa estabilidade. Por exemplo: embora controverso (mesmo em instâncias superiores), o entendimento majoritário dos julgadores ainda parece caminhar no sentido do não reconhecimento da estabilidade provisória da gestante, nos casos em que a gravidez tenha iniciado ainda no contrato de experiência, nos termos da Súmula 244, inciso III, do TST:

Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.”

O acidente de trabalho (ou doença ocupacional) também pode gerar estabilidade provisória, com fulcro no art. 118 da Lei 8.213/1991:

“O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.”

E se o acidente de trabalho ocorrer durante o contrato de experiência? Seria isso um óbice para concessão da estabilidade provisória prevista na Lei 8.213/1991?

Como o texto legal não se preocupou em restringir a estabilidade pós-acidente a nenhuma modalidade de contrato (se por tempo determinado, ou indeterminado), a diversidade interpretativa dos magistrados também pode ser observada no que tange a esse tema. Assim como em outras questões polêmicas, aqui também parece não haver consenso. O julgado abaixo vem no sentido de não reconhecer a estabilidade acidentária, quando o infortúnio ocorrer durante o contrato de experiência.

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. Tratando-se de acidente de trabalho ocorrido na vigência de contrato de experiência, não há que se falar em garantia de emprego, visto que a estabilidade provisória prevista no art. 118 da Lei 8.213/91, em face de sua natureza, não se destina aos contratos a termo. Recurso de revista conhecido e desprovido.” (TST-RR-234/2006-601-04-00.4).

No caminho inverso, elencamos uma série de decisões que parecem demonstrar o entendimento majoritário dos ministros do TST (Tribunal Superior do Trabalho).

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. O art. 118 da Lei nº 8.213/91 não comporta leitura restritiva, no sentido de não estender a estabilidade provisória decorrente de acidente de trabalho aos contratos de experiência, já que previu, de forma geral, garantia ao empregado para reinserção e aproveitamento no mercado de trabalho. Precedentes. Recurso de Revista conhecido e provido.” (RR-71000-56.2008.5.04.0030)

EMENTA: “RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI 11.496/2007. GARANTIA DE EMPREGO. ACIDENTE DE TRABALHO. CONTRATO DE TRABALHO A TERMO. COMPATIBILIDADE. EMPREGADO CONTRATADO POR EXPERIÊNCIA. (...) 7. Tendo o empregador o dever de proteção, de segurança, de zelo pela incolumidade física e mental de seus empregados, não se harmoniza com a boa-fé objetiva, tampouco com a função social da empresa, o rompimento do contrato de trabalho, logo após o retorno do afastamento ocasionado pelo acidente de trabalho sofrido na entrega do labor ao empreendimento patronal, ainda que o liame tenha sido firmado a termo, presumindo-se - presunção juris tantum - discriminatória a extinção do vínculo em tais circunstâncias, considerada a situação de debilidade física comumente verificada no período que sucede a alta previdenciária, a acarretar a ilicitude da dispensa, pelo abuso que traduz, e viciar o ato, eivando-o de nulidade. (...) 19. Ao reconhecer o direito do autor à indenização referente ao período estabilitário de 12 meses e consectários, a Turma privilegiou os princípios da proporcionalidade, da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho, da função social da empresa, do meio ambiente de trabalho seguro, da boa-fé objetiva e da não-discriminação, imprimindo interpretação sistemática da legislação pertinente, à luz da Constituição da República - norma fundamental do ordenamento jurídico. Recurso de embargos conhecido e não provido.” (RR-9700-45.2004.5.02.0465)

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. ACIDENTE DE TRABALHO. GARANTIA PROVISÓRIA NO EMPREGO. 1 - Há direito à garantia provisória no emprego, na hipótese de contrato de experiência, ante o acidente de trabalho, nos termos do art. 118 da Lei nº 8.213/91. 2 - A força normativa da Constituição Federal, que atribui especial destaque às normas de saúde e segurança do trabalhador (art. 7º, XXII e XXVIII), impõe a interpretação sistemática da legislação infraconstitucional que trata da matéria, de maneira a reconhecer a compatibilidade entre o contrato de experiência e a garantia provisória no emprego. 3 - O art. 118 da Lei nº 8.213/91 é aplicável porque o afastamento relacionado ao acidente de trabalho integra a essência sóciojurídica da relação laboral. 4 - O contrato de experiência não se transforma em contrato por prazo indeterminado, sendo direito do trabalhador somente a garantia provisória no emprego pelo prazo de um ano, contado da data do término do benefício previdenciário. 5 - Recurso de revista a que se dá provimento parcial, quanto ao tema.” (RR-51300-93.2006.5.15.0051).

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. 1. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DOENÇA OCUPACIONAL. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. O entendimento jurisprudencial desta Corte, consubstanciado no item II da Súmula 378, é de que a constatação, após a despedida, de doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de trabalho é pressuposto para a concessão da estabilidade provisória. Na hipótese, o Regional, soberano na análise das provas, constatou - a existência da doença ocupacional e o nexo causal -, pelo que faz jus à estabilidade provisória, nos moldes do artigo 118 da Lei 8.213/91. Outrossim, não há incompatibilidade do contrato de experiência com a estabilidade provisória decorrente de acidente de trabalho. Precedentes. Recurso de revista não conhecido.” (RR-3404900-92.2009.5.09.0041).

EMENTA: ”ACIDENTE DE TRABALHO. PERÍODO DE EXPERIÊNCIA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO CONTRATUAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA DE EMPREGO. ARTIGO 118 DA LEI Nº 8.213/91. COMPATIBILIDADE COM O CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. PACTO CELEBRADO COM ÂNIMO DE CONTINUIDADE. Discute-se a possibilidade de se aplicar a estabilidade provisória prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 a empregado submetido a contrato de trabalho temporário de experiência. No caso sob exame, o contrato encontrava-se em vigor quando ocorreu o infortúnio - evento imprevisível e capaz de impedir que o contrato alcançasse o termo final predeterminado pelas partes. O artigo 472, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho deve ser interpretado de forma sistemática, em consonância com outras normas de caráter tutelar consagradas no ordenamento jurídico pátrio, entre elas o artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 63 da Lei nº 8.213/91. Tais dispositivos consagram proteção especial ao trabalhador acidentado, devendo prevalecer sobre outras normas, de caráter genérico, como o artigo 472, § 2º, da CLT, cuja aplicabilidade restringe-se aos períodos de afastamento não resultantes de acidente de trabalho. De se notar, entretanto, que a estabilidade acidentária é compatível com o contrato a termo somente quando este for celebrado a título de experiência , porquanto, neste caso, presente o ânimo de continuidade da relação de emprego. Conquanto não se possa antecipar se a experiência será exitosa ou não, o incidente ocorrido no curso desse contrato a termo frustra totalmente a possibilidade de permanência do trabalhador no emprego após o período de experiência. Ora, o ânimo de permanência no emprego, que resulta da celebração do contrato de experiência, é o elemento que distingue esta modalidade de contrato a termo das demais hipóteses para efeito de incidência da norma garantidora da estabilidade acidentária. Recurso de revista conhecido e não provido.” (RR-42600-22.2004.5.04.0305).

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. Tratando-se de acidente de trabalho ocorrido na vigência de contrato de experiência, existe garantia de estabilidade no emprego, conforme previsto no artigo 118 da Lei nº 8.213/91, pois, por força do disposto no artigo 7º, XXII, da CF, que transfere ao empregador a obrigação de adotar medidas que visem à saúde, higiene e segurança do trabalhador, torna-se imperioso uma interpretação mais flexível das normas infraconstitucionais que tratam da matéria, para reconhecer a compatibilidade entre o contrato de experiência e a garantia provisória no emprego decorrente de acidente de trabalho. Ressalva do Relator. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR-180200-73.2009.5.03.0035).

EMENTA” RECURSO DE REVISTA - CONTRATO DE EXPERIÊNCIA - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - ACIDENTE DO TRABALHO - ARTIGO 118 DA LEI N° 8.213/91. 1. A interpretação teleológica do art. 118 da Lei nº 8.213/91 conduz à conclusão de que o dispositivo não comporta leitura restritiva, no sentido de não estender a estabilidade provisória decorrente de acidente de trabalho aos contratos de experiência, eis que prevê garantia ao empregado para reinserção e aproveitamento no mercado de trabalho. 2. Não se pode entender que a finalidade do contrato de experiência foi cumprida, quando, diante do infortúnio, o Autor é tolhido da possibilidade de demonstrar desempenho satisfatório na incipiente relação de emprego, especialmente quando o sinistro guarda conexão com a própria prestação de serviços - tanto que restou caracterizado o acidente de trabalho, nos termos da legislação previdenciária. Recurso de Revista conhecido e desprovido.” (RR-398200-65.2008.5.09.0663).

EMENTA” RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA DECORRENTE DE ACIDENTE DO TRABALHO (ART. 118 DA LEI Nº 8.213/91). CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. CABIMENTO. 1. 'O contrato de experiência é modalidade de ajuste a termo, de curta duração, que propicia às partes uma avaliação subjetiva recíproca: possibilita ao empregador verificar as aptidões técnicas e o comportamento do empregado e a este último analisar as condições de trabalho' (Desembargadora Alice Monteiro de Barros). Cuida-se de contrato especial, diverso daqueles (de prazo determinado) a que a Lei o irmana, na medida em que traz como ínsita à sua natureza a expectativa de prorrogação e indeterminação, sendo esta circunstância chancelada pela normalidade dos fatos, pelo que ordinariamente acontece. Em tal espécie, não está o contrato ligado a trabalho ou atividade empresarial transitórias, mas se agrega ao absoluto cotidiano dos contratos de prazo indeterminado mantidos pelo empregador, salvo pela possibilidade de se definir prazo de duração. 2. O art. 118 da Lei nº 8.213/91, respondendo à diretriz do art. 7º, XXII, da Carta Magna, afirma que 'o segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente da percepção de auxílio-acidente.' 3. Com atenção aos fins sociais buscados pela Lei (LICC, art. 5º), não se deve, no entanto, rejeitar a estabilidade provisória do empregado acidentado no curso de contrato de experiência. O infortúnio do trabalhador ceifa-lhe a oportunidade de manutenção do trabalho - expectativa que legitimamente mantém -, impondo-lhe o desemprego por força de evento que, acrescido o dano à sua saúde, decorre de fato estritamente vinculado à atividade empresarial. Não se espera que, ante o ônus que a Lei ordena, permitindo-se-lhe o desfazimento do pacto laboral, opte o empregador pela sua prorrogação. Mesmo que viessem a ser aprovadas as suas aptidões técnicas, o empregado amargará as conseqüências de sua saúde deteriorada sob a austeridade e sofrimento do desemprego. Não disporá do prazo que o ordenamento objetivo, sabiamente, disponibilizaria à sua recuperação. 4. Devida a estabilidade provisória, ainda quando se cuide de contrato de experiência. Precedente. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido.” (RR-1110/2007-019-12-00.2).

EMENTA: “ACIDENTE DE TRABALHO. PERÍODO DE EXPERIÊNCIA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO CONTRATUAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA NO EMPREGO. ARTIGO 118 DA LEI Nº 8.213/91. COMPATIBILIDADE COM O CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO DE EXPERIÊNCIA. PACTO CELEBRADO COM ÂNIMO DE CONTINUIDADE. Discute-se a possibilidade de se aplicar a estabilidade provisória prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 a empregado submetido a contrato de trabalho temporário de experiência. No caso sob exame, o contrato encontrava-se em vigor quando ocorreu o infortúnio - evento imprevisível e capaz de impedir que o contrato alcançasse o termo final predeterminado pelas partes. O artigo 472, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho deve ser interpretado de forma sistemática, em consonância com outras normas de caráter tutelar consagradas no ordenamento jurídico pátrio, entre elas o artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 63 da Lei nº 8.213/91. Tais dispositivos consagram proteção especial ao trabalhador acidentado, devendo prevalecer sobre outras normas, de caráter genérico, como o artigo 472, § 2º, da CLT, cuja aplicabilidade restringe-se aos períodos de afastamento não resultantes de acidente de trabalho. De se notar, entretanto, que a estabilidade acidentária é compatível com o contrato a termo somente quando este for celebrado a título de experiência, porquanto, neste caso, presente o ânimo de continuidade da relação de emprego. Conquanto não se possa antecipar se a experiência será exitosa ou não, o incidente ocorrido no curso desse contrato a termo frustra totalmente a possibilidade de permanência do trabalhador no emprego após o período de experiência. Ora, o ânimo de permanência no emprego, que resulta da celebração do contrato de experiência, é o elemento que distingue esta modalidade de contrato a termo das demais hipóteses para efeito de incidência da norma garantidora da estabilidade acidentária. Assim, o acidente de trabalho ocorrido por culpa do empregador, que detém o encargo de estabelecer mecanismos tendentes a evitar infortúnios no ambiente laboral - cumprindo as normas de saúde, segurança e higiene -, bem como a responsabilidade social do detentor dos meios de produção pelos riscos do empreendimento - inferida da exegese do artigo 170, inciso III, da Carta Política -, coloca sob ônus do empregador a manutenção do vínculo empregatício enquanto o obreiro estiver em período de incapacidade ou redução da capacidade laborativa que, de acordo com a norma preconizada no artigo 118 da Lei nº 8.213/91, tem a duração de um ano. Não se olvide, ainda, que o juiz aplicará a lei atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil). Ao aplicador da lei, portanto, cabe lançar mão do método teleológico, para encontrar o sentido da norma que realize os fins sociais por ela objetivados. Assim, não se realizará os fins sociais da lei de proteção ao trabalhador se este, vítima de acidente laboral, for lançado ao mercado de trabalho. A dificuldade de colocação desse trabalhador no mercado de trabalho afeta o ideal de realização de justiça social e atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana consagrado no artigo 1º, III, da Constituição da República. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR-1762/2003-027-12-00.8).


Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

quinta-feira, 1 de março de 2012

"INSS DÁ APTO, MÉDICO DO TRABALHO DÁ INAPTO: EMPRESA PAGA INDENIZAÇÃO".

Vídeo-aula relacionado com esse tema:



Prezados leitores.

Está se tornando recorrente: Médico Perito do INSS considera o empregado “capaz” para retorno às suas atividades laborais, mas o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” (inquestionavelmente bem intencionado) considera esse mesmo trabalhador “inapto”. Resultado: empresa é obrigada a pagar indenização a esse empregado, em virtude do transtorno causado durante esse impasse entre os médicos.

Haverá o tempo (e não tardará) em que as empresas começarão a chamar o Médico do Trabalho/”Médico Examinador” ao processo, no sentido de dividir com ele essa indenização (denunciação da lide – art. 70, inciso III, do Código de Processo Civil); ou mesmo entrar com uma ação futura contra esse médico no sentido de reaver algum prejuízo financeiro (ação regressiva – art. 934 do Código Civil). Isso porque, não basta estar bem intencionado... é preciso cumprir a lei. Abordo essa questão com maior profundidade através do texto: “Perito do INSS x Médico do Trabalho: a quem seguir?” (Link: http://bit.ly/hyz0cn ).

Sobre o tema desse texto, vejam a matéria veiculada em 29/02/2011 no site do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG).

Responsabilidade por salários de empregado considerado inapto pela empresa após alta previdenciária é do empregador

EMENTA: “ALTA PREVIDENCIÁRIA. RETORNO DO EMPREGADO. RECUSA DO EMPREGADOR. EFEITOS DO CONTRATO DE TRABALHO. Se o empregador mantém em vigor o contrato de trabalho da empregada, mesmo após o INSS e a Justiça Federal terem indeferido o restabelecimento do benefício previdenciário, ao fundamento de existência de capacidade laborativa, ele deve arcar com todos os efeitos pecuniários da ausência de suspensão do contrato de trabalho, mesmo não tendo havido prestação de serviço.” (ED 0000475-44.2011.5.03.0136)

É frequente a situação em que empregados, depois de algum tempo recebendo benefício por incapacidade, são considerados aptos pela perícia médica do INSS, mas inaptos pelo médico do trabalho da empresa. Impedidos de retornar ao trabalho pelos empregadores, acabam ficando em uma espécie de “limbo jurídico”, sem receber qualquer remuneração no período. Surge então o questionamento: de quem é a responsabilidade pelo pagamento dos salários e demais verbas trabalhistas no período após a alta do INSS?

Ao analisar um desses casos, a 5ª Turma do TRT-MG, com base no voto do juiz convocado Jessé Cláudio Franco de Alencar, entendeu que é da empresa essa responsabilidade. Na inicial, a reclamante relatou que foi admitida em 01/08/01 para exercer a função de auxiliar de serviços gerais. Acometida de artrose nos joelhos em novembro de 2006, recebeu benefício previdenciário até maio de 2009. Ao se apresentar ao trabalho, contudo, foi encaminhada para avaliação médica da empresa que concluiu pela inaptidão, com novo encaminhamento para o INSS. Não tendo conseguido receber novo benefício, ajuizou ação perante a Justiça Federal, a qual, no entanto, foi julgada improcedente. A partir de fevereiro de 2011 passou a tentar retornar ao trabalho, mas foi novamente considerada inapta pelo médico da reclamada. No final das contas, ficou sem receber remuneração e/ou benefício previdenciário a partir de junho de 2009.

O relator considerou inadmissível a situação de eterna indefinição por que passou a reclamante. Ao se basear apenas no diagnóstico do médico do trabalho, a reclamada contrariou não apenas a conclusão do órgão previdenciário, como também de uma decisão da Justiça Federal. Assim, a reclamante ficou à mercê de sua própria sorte, sem receber nem salário e nem benefício previdenciário. "A obreira não pode ser submetida indefinidamente ao impasse de a empregadora recusar a lhe oferecer o posto de trabalho em decorrência de uma incapacidade que não é reconhecida nem pela autarquia previdenciária, nem judicialmente", destacou o julgador.

No entender do magistrado, o simples encaminhamento do empregado ao INSS não isenta o empregador de suas obrigações trabalhistas. Se a reclamada optou por manter em vigor o contrato de trabalho, deve arcar com todas as verbas daí decorrentes, mesmo não tendo havido prestação de serviço. "O que não se pode admitir é que a reclamante não receba salários para prover o seu sustento e, ao mesmo tempo, fique atrelada a um contrato de trabalho cujo empregador lhe recuse trabalho, sem receber nem mesmo parcelas rescisórias", concluiu.

Por esses fundamentos, foi mantida a sentença que condenou a reclamada a disponibilizar o posto de trabalho da reclamante nas mesmas condições ou em condições melhores, além do pagamento de salários vencidos e vincendos e mais as verbas trabalhistas de direito, como férias, 13º e recolhimento de FGTS. O entendimento foi acompanhado pela maioria da Turma julgadora.


Fonte: Site do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG).

Link direto para matéria: http://bit.ly/xOT6St

Mais ementas de processos, na mesma linha de raciocínio:

EMENTA: “AFASTAMENTO DO EMPREGADO. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INAPTIDÃO DECLARADA PELO MÉDICO DA EMPRESA. Comprovada a tentativa do autor de retornar ao trabalho e atestada a sua capacidade pela autarquia previdenciária, cabia a reclamada, no mínimo, readaptar o obreiro em função compatível com a sua condição de saúde, e não simplesmente negar-lhe o direito de retornar ao trabalho, deixando de lhe pagar os salários. Como tal providência não foi tomada, fica a empregadora responsável pelo pagamento dos salários e demais verbas do período compreendido entre o afastamento do empregado e a efetiva concessão do beneficio previdenciário.” (RO 01096-2009-114-03-00-4)

EMENTA: “INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. A reclamada agiu abusivamente ao impedir o retorno do reclamante ao trabalho após a alta médica, caracterizando-se tal procedimento como ato ilícito, que enseja a reparação pretendida. A configuração do dano moral na hipótese é inequívoca, como consequência da condição imposta ao autor de permanecer ocioso sem exercer as suas atividades, sendo patentes o constrangimento e a angústia sofridos pelo reclamante.” (RO 001064-87.2010.5.03.0098)

Um forte abraço a todos.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha