terça-feira, 21 de maio de 2013

INSS LIBEROU, MÉDICO DO TRABALHO RECUSOU: EMPRESA INDENIZOU.

21/05/2013: Empresa é condenada por não readmitir funcionário afastado por doença. Empregado também ficou sem receber seus salários

Uma empresa de transporte de passageiros terá que pagar indenização no valor de R$ 25 mil, além de seis meses de salários não pagos, a um funcionário afastado por problemas de saúde. O caso foi julgado pela Vara do Trabalho de Caxambu, no Sul do estado, e a condenação mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Minas.

Conforme o processo, após cinco anos de serviço, o funcionário adoeceu e se afastou por alguns meses, em licença médica. Depois de passar por perícia e ser considerado apto pela Previdência Social, apresentou-se à empresa. Mas a empregadora não permitiu seu retorno ao serviço e também não pagou seus salários, a partir da alta previdenciária. Após seis meses, o trabalhador foi colocado à disposição da empregadora, na garagem da empresa, sem que lhe fosse atribuída qualquer função.

Inconformado, ele procurou a Justiça pedindo indenização pelos danos morais. Em defesa, a ré respondeu que não recebeu de volta o trabalhador porque o médico da empresa o considerou inapto, na ocasião. Seis meses depois, ao ser reavaliado, ele foi considerado apto, embora com restrições, sendo imediatamente reintegrado.

Mas o juiz entendeu, com base no laudo do perito oficial, que o empregado estava em perfeitas condições físicas e psíquicas para o trabalho logo após a alta previdenciária, tendo sido impedido de trabalhar. "Ou seja, ao constatar a inaptidão do empregado que já recebeu alta do INSS, o empregador não pode, simplesmente, mandá-lo para casa, deixando-o sem salários e sem qualquer amparo do órgão previdenciário até o dia em que possa novamente ser considerado apto pela empresa", frisa o juiz Marco Antônio Ribeiro Muniz Rodrigues.

Fonte:


Trechos do acórdão

“Incontroverso que foi negado ao obreiro o trabalho, impondo-lhe a inação e o prejuízo salarial. Jamais poderia o empregador simplesmente constatar a inaptidão o empregado e mandá-lo para casa, mormente sabendo que este já recebera do INSS o diagnóstico de apto. Ao adotar tal comportamento o empregador deixa obreiro entregue à sua própria sorte. Mas, não é só isso, mesmo quando o acolheu, nenhuma medida tomou para readaptá-lo impondo-lhe inação compulsória.

O perito do juízo censura o comportamento do médico do trabalho da empresa. A defesa que a recorrente faz do seu médico não deve prosperar, pois calcada na lógica do corporativismo, que não raro é o responsável por lamentáveis violações éticas. Induvidoso que houve inércia do médico da empresa que simplesmente discordou do laudo do INSS, mas não tomou nenhuma providência para proteger a saúde do trabalhador, seja acolhendo-o em outra função, seja oferecendo um laudo, ou acompanhamento, ou qualquer outra medida que considerasse cabível para solver a questão do empregado, tudo, menos simplesmente cruzar os braços e abandoná-lo ao seu destino.

A obrigação de indenizar, no caso em tela, mostra-se evidente, pois restaram caracterizados, de forma clara e irretorquível, os elementos componentes da responsabilidade civil, ou seja, uma ação ou omissão; a culpa imputável ao agente causador do dano; o dano em si e o nexo de causalidade, entre a ação ou omissão e o dano, tudo isso em estrita consonância com o disposto no art. 186 do Código Civil.

Belo Horizonte/MG, 28 de fevereiro de 2013.

PAULO ROBERTO DE CASTRO – Desembargador Relator.”

Processo: 0000095-42.2012.5.03.0053 RO

domingo, 19 de maio de 2013

CFM: MÉDICO DE EMPRESA AGORA PODE SER ASSISTENTE TÉCNICO.


Prezados leitores.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) redigiu a Resolução n. 2015/2013 (publicada no Diário Oficial da União, dia 17/05/2013). Através dela, o CFM passa a reconhecer como ética a atuação de médicos que atuam (ou tenham atuado) junto às empresas como assistentes técnicos em perícias.

Abaixo, alguns trechos da nova resolução:

“(...)

CONSIDERANDO as frequentes demandas judiciais que questionam a proibição de atuação do médico de empresa como assistente técnico desta, (...) resolve:

Art. 1º O art. 12 da Resolução CFM nº 1.488, de 11 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 12. O médico de empresa, o médico responsável por qualquer programa de controle de saúde ocupacional de empresa e o médico participante do serviço especializado em Segurança e Medicina do Trabalho não podem atuar como peritos judiciais, securitários ou previdenciários nos casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos (atuais ou passados)";

(Obs.: percebemos que a figura do “assistente técnico” foi excluída desta resolução – grifo nosso.)

Art. 2º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação

Art. 3º Revoga-se o artigo 12 da Resolução CFM nº 1.488, de 11 de fevereiro de 1998, publicada no D.O.U. de 6 de março de 1998, Seção I, p.150.

ROBERTO LUIZ D'AVILA
Presidente do Conselho

HENRIQUE BATISTA E SILVA
Secretário-Geral

sábado, 18 de maio de 2013

FISIOTERAPEUTA COMO "PERITO MÉDICO": UM ATO CRIMINOSO?


Prezados leitores.

A participação de fisioterapeutas como peritos judiciais, em lides que envolvam os chamados “assuntos médicos”, é um tópico sempre muito polêmico.

Na postagem anterior, mostrei uma série de decisões que mostram que, mesmo entre os julgadores, essa é uma pauta completamente aberta e não pacificada.

E no que tange às questões penais? O profissional fisioterapeuta que atua como perito judicial num processo que envolva, por exemplo, o diagnóstico de uma doença ocupacional, atua de forma criminosa? Faz exercício ilegal da medicina? Incorre na prática do curandeirismo?

Vejamos abaixo alguns artigos do vigente Código Penal brasileiro:

Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica
Art. 282 - Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe os limites:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único - Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também multa.

Curandeirismo
Art. 284 - Exercer o curandeirismo:
III - fazendo diagnósticos:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único - Se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica também sujeito à multa.

Com base em tais artigos, muitos estudiosos (a quem verdadeiramente respeito e admiro) entendem que um profissional fisioterapeuta que atua como perito judicial num processo que envolva, por exemplo, o diagnóstico de uma doença ocupacional, atua sim de forma criminosa, fazendo exercício ilegal da medicina, e incorrendo na prática do curandeirismo.

Como médico (e defensor árduo desta classe profissional), gostaria de compactuar com tais pensadores... mas isso não me seria sincero à luz do pouco das ciências jurídicas que aprendi. Explico: os artigos 282 e 284 do Código Penal (supra citados) deixam claros a ilicitude e, consequentemente, o ato criminoso daqueles que realizam o exercício ilegal da medicina e a prática do curandeirismo (por exemplo, realizando diagnósticos que ultrapassem os limites de suas competências profissionais).

No entanto, o mesmo Código Penal, e seu artigo 23, assim coloca:

Não há crime quando o agente pratica o fato: 
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Suponhamos então, por exemplo, que o juiz espontaneamente nomeie um fisioterapeuta para que este profissional realize uma perícia judicial que envolva o diagnóstico de uma doença ocupacional, dando-lhe a opção de aceitar ou recusar esse nobre ofício. Por sua vez, este fisioterapeuta aceita tal encargo. A partir de agora, caberá ao fisioterapeuta cumprir o dever legal que lhe foi outorgado, nos termos do art. 422 do Código de Processo Civil, que assim nos ensina:

O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido, independentemente de termo de compromisso.

Na mesma esteira, o próprio Código Penal, em seu artigo 330, nos faz interpretar que o descumprimento de uma ordem judicial também deve ser qualificada e autuada como crime.

Ora, se o próprio juiz (dentro da sua margem de discricionariedade) outorgou para esse profissional fisioterapeuta a tarefa de confeccionar o laudo pericial, a realização deste trabalho constitui-se, a partir de então, uma obrigação, um estrito cumprimento de dever legal e, portanto, exclui qualquer possibilidade de crime do ato. Não há mais que se cogitar a hipótese (também discutível – em virtude da ainda falta de previsão legal do que realmente venha a ser o chamado “ato médico”) de crime de exercício ilegal de medicina e/ou de curandeirismo, pois a antijuridicidade foi literalmente excluída nos termos no art. 23, III, do Código Penal, combinado com art. 422 do Código de Processo Civil. Ratificando: foi o próprio juiz quem escolheu este fisioterapeuta, e de forma espontânea.  

Aos que assim não entendem, cabe uma reflexão a mais: se um eventual crime não foi desconstituído, o mandante do crime então é o próprio juiz e, portanto, também deverá ser considerado criminoso. Reflitamos sem paixão e com franqueza: alguém já ouviu falar de algum magistrado que tenha sido condenado penalmente por tal ato? Que tenha sido preso por tal conduta? Que nossas análises jamais se desconectem da realidade fática.

Alguns dirão: “mas um juiz trabalhista pode mesmo escolher um profissional não médico para a realização de uma perícia de diagnóstico de doença ocupacional?” Assim nos traz o Código de Processo Civil (CPC):

Art. 145. Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421.
§ 1º Os peritos serão escolhidos entre profissionais de nível universitário, devidamente inscritos no órgão de classe competente, respeitado o disposto no Livro I, Título VIII, Capítulo VI, Seção VII, deste Código.
§ 2º Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em que estiverem inscritos.
§ 3º Nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do juiz.

Tenho observado na prática pericial, especialmente na Justiça do Trabalho, uma grande dificuldade dos magistrados em conseguir médicos para atuar como peritos. Os baixos honorários pagos, aliados à demora no recebimento destes, são os principais fatores relacionados à falta de médicos no campo pericial trabalhista. Da forma como as coisas estão estruturadas na Justiça do Trabalho, o desestímulo médico é evidente.

No entanto, se os médicos, de forma legítima, abrem mão do ofício pericial em virtude da baixa remuneração, a Justiça não pode parar por esse motivo. Em regra, os magistrados são sensíveis aos baixos valores pagos pelas atividades periciais (a todos os profissionais que a executam), ao mesmo tempo em que não possuem autonomia legislativa e orçamentária para mudar esse cenário. Aplica-se, então, uma adequação do “princípio da reserva do possível” no que tange ao pagamento dos honorários periciais.

Nesse contexto, ganha força o § 3º do art. 145 do CPC: “nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do juiz”. Tal dispositivo era para ser uma exceção, mas em alguns locais, já se configura como regra. Ou seja, se um profissional (qualquer um) não aceitar o encargo pericial, outro profissional (qualquer um) poderá ser indicado mediante livre escolha do juiz. Chocante para muitos? Sim, mas é o que nos ensina as leis que elencamos ao longo desse texto.  

À vontade para os sempre bem-vindos contraditórios e outros posicionamentos quanto ao tema.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha
Facebook / Instagram / Flickr: marcoshmendanha

FISIOTERAPEUTAS PODEM REALIZAR "PERÍCIAS MÉDICAS"?

Prezados leitores.

Na visão dos magistrados, os fisioterapeutas podem realizar perícias normalmente atribuídas aos médicos? A resposta mais equilibrada, sem extremismos apaixonados, e desprovida de vaidades profissionais é: depende do magistrado.

Elencamos uma séria de decisões judiciais sobre esse tema. De maneira clara, percebemos que as convicções variam entre os julgadores.

Exemplos de decisões que deferiram perícias confeccionadas por fisioterapeutas.

“É possível a realização de perícia por fisioterapeuta e não médico, uma vez que a nomeação do perito encontra-se dentro da margem de discricionariedade do magistrado.” (AI 990.10.191432-8/TJ-SP)

“O fato de a perícia ter sido realizada por fisioterapeuta e não médico não traz nulidade, uma vez que é profissional de nível universitário, de confiança do juízo e que apresentou laudo pericial minucioso e completo quanto às condições físicas da autora, inclusive com explicitação da metodologia utilizada e avaliação detalhada.” (Recurso Extraordinário n. 313.348/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ACIDENTÁRIA. NOMEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA COMO PERITO JUDICIAL. NULIDADE INOCORRENTE. PERÍCIA JÁ REALIZADA DE FORMA MINUDENTE, COM O EMPREGO DE METODOLOGIA TÉCNICO-CIENTÍFICA. EXPERT QUE ATUOU EM MAIS DE UMA CENTENA DE CASOS NO JUÍZO A QUO. PROFISSIONAL DETENTOR DE ESPECIALIZAÇÃO ACADÊMICA NA ÁREA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.” (AI 2009.072716-5/TJ-SC)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ACIDENTÁRIA. NO-MEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA COMO PERITO JUDICIAL. PEDIDO DE SOBRESTAMENTO DOS EFEITOS DA DECISÃO E NOMEAÇÃO DE PROFISSIONAL DA MEDICINA. PERÍCIA JÁ REALIZADA E PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS JÁ PROMOVIDO. PERDA DE OBJETO DO RECURSO. ENTEN-DIMENTO DESTA CÂMARA, ADEMAIS, A FAVOR DA NOMEA-ÇÃO DE PROFISSIONAL FISIOTERAPEUTA.” (AI 477288 SC 2010.047728-8)

“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. INCAPACIDADE. INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. I — A peça técnica apresentada pelo Sr. Perito, profissional de confiança do Juiz e equidistante das partes, foi conclusiva no sentido da inexistência de incapacidade do autor. II — O fato de a perícia ter sido realizada por fisioterapeuta e não médico não traz nulidade, uma vez que é profissional de nível universitário, de confiança do juízo e que apresentou laudo pericial minucioso e completo quanto às condições físicas da autora, inclusive com explicitação da metodologia utilizada e avaliação detalhada.” (Processo 2008.03.99.043750-1 — TRF3)

“PERÍCIA REALIZADA POR PROFISSIONAL DA FISIOTERAPIA. PREVISÃO LEGAL. Na sua órbita de atuação, com os registros sobre a regulamentação do exercício da profissão pelo COFFITO (Res. n. 259/2004), o profissional da fisioterapia pode e deve ser auxiliar do Juízo sempre que se fizer necessário, com ampla previsão na legislação processual (art. 420 e seguintes, do CPC).” (RO 00089.2008.004.13.00-4 — TRT13)

“EMENTA — PERÍCIA EFETUADA POR FISIOTERAPEUTA — ADMISSIBILIDADE — A legislação trabalhista estabelece critérios fixos quanto à realização de perícia somente no que pertine à prova de insalubridade ou periculosidade no ambiente laboral, na forma do art. 195 da CLT, reportando-se que esta se realizará pelas mãos de médico ou engenheiro do trabalho. Acata-se, pois, a realização de laudo pericial por profissional fisioterapeuta, para apuração de males decorrentes das condições laborais, com arrimo os termos do art. 145, §§ 1º e 2º do CPC, aplicável, subsidiariamente, por expressa determinação celetista.” (RO 0112900-32.2008.5.15.0153 — TRT15)

“E M E N T A — APELAÇÃO CÍVEL — INSS — LAUDO PERICIAL ELABORADO POR FISIOTERAPEUTA — POSSIBILIDADE —APOSENTADORIA POR INVALIDEZ — CORREÇÃO MONE-TÁRIA PELO IGPM — JUROS MORATÓRIOS DE 1% AO MÊS. Não deve ser considerado inválido laudo pericial apenas por ter sido elaborado por fisioterapeuta, eis que este possui conhecimento em Cinesiologia, a ciência que tem como enfoque a análise dos movimentos, sendo tecnicamente hábil para atuar como auxiliar do Juízo.” (AC 27927 MS 2009.027927-9)

Exemplos de decisões que não deferiram perícias confeccionadas por fisioterapeutas.

“Sustenta a reclamante, em síntese, às fls. 391/407, que o perito que elaborou o laudo técnico possui todas as condições necessárias para atuar no feito, nos termos da legislação processual pertinente, tais como nível de escolaridade universitário e habilitação no órgão específico. Salienta que o profissional de fisioterapia detém conhecimentos médicos, motivo pelo qual resulta desarrazoada a alegação de carência de conhecimentos específicos. (...) No caso concreto, a Corte de origem consignou que o laudo pericial produzido pelo experto não serviria de prova suficiente a amparar a pretensão da reclamante. Depreende-se, da leitura do acórdão recorrido, que o Tribunal Regional (de Mato Grosso do Sul) admitiu que o perito carecia de conhecimentos técnicos específicos que permitissem produzir laudo conclusivo, suficiente à formação de juízo de valor, pelo julgador, com a necessária segurança.” (TST-AIRR e RR-56846/2002-900-24-00.7)

“A elaboração de perícia será determinada sempre que a prova do fato depender de conhecimento especial de técnico. Assim, o juiz nomeará perito, com qualificação técnica, sendo permitida às partes a indicação de assistente técnico e formulação de quesitos (arts. 420 e 421 do Código de Processo Civil). O exame pericial foi realizado por fisioterapeuta, profissional de confiança do juízo. In casu, contudo, tratando-se de demanda objetivando a concessão de benefício previdenciário por incapacidade, há de se observar o disposto no art. 42, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, em que o reconhe-cimento da incapacidade depende de exame médico-pericial.” (Processo n. 07.00.00157-1 — TRF3)

“EMENTA: ACIDENTE DO TRABALHO TÍPICO. PROVA DA EXISTÊNCIA E EXTENSÃO DE DANOS FÍSICOS. LAUDO PRODUZIDO POR FISIOTERAPEUTA. NULIDADE. Em processos em que se discute a existência ou não de sequelas decorrentes de acidente do trabalho típico a perícia deve ser feita, necessariamente, por médico. Não se pode admitir, nesses casos, seja o laudo produzido por fisioterapeuta, eis que este não possui formação nem capacitação técnica para realizar diagnósticos e, muito menos, para atestar sobre a existência ou não de dano físico sofrido autor em decorrência do acidente de que foi vítima no exercício de suas atividades laborativas na empresa-ré. Nulidade processual que se acolhe.” (RO 02090-2007-092-03-00-0 TRT-MG)

“DOENÇA OCUPACIONAL: NÃO CONFIGURADA. Na hipótese em testilha, impõe-se a prevalência do trabalho pericial que ratifica a tese defensória, elaborado por médico do trabalho, em detrimento daquele que corrobora a argumentação obreira, confeccionado por fisioterapeuta, por conta da maior profundidade, objetividade e clareza do primeiro, como bem colocado pelo N. Julgador Singular. Sentença de improcedência mantida.” (RO 0112900-02.2005.5.15.0100 — TRT15)


“EMENTA: DOENÇA OCUPACIONAL — PERÍCIA — FISIOTERAPEUTA — AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO PROFIS-SIONAL PARA EFETUAR DIAGNÓSTICO E ESTABELECER O NEXO CAUSAL. Conforme previsto no art. 3º do Decreto n. 938/1969, o profissional fisioterapeuta está habilitado apenas para “executar métodos e técnicas fisioterápicos com a finalidade de restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do paciente”, o que não pode ser confundido com diagnosticar doenças físicas ou estabelecer conclusões quanto ao respectivo nexo causal. Nos termos do art. 195, caput, da CLT, que disciplina a apuração de insalubridade e periculosidade nos locais de trabalho, a prova pericial nesta Justiça Especializada deve ser realizada por médico ou engenheiro do trabalho. Assim, ainda que não se discuta na presente controvérsia a existência de trabalho insalubre ou perigoso, a designação de outro especialista para a realização de prova pericial somente seria admissível se não existisse na localidade profissionais com a qualificação exigida, por aplicação subsidiária do disposto no § 3º, do art. 145, do CPC, hipótese sequer cogitada no caso dos autos. Portanto, não há como atribuir valor probante ao trabalho pericial realizado por profissional que não detém a necessária capacitação técnica. Recurso ordinário que se acolhe, para declarar a nulidade da sentença e a invalidade da prova pericial produzida nos autos, determinando seu retorno à Vara do Trabalho de origem, a fim de que outra perícia seja realizada, por profissional médico devidamente habilitado, proferindo-se nova decisão, como entender de direito o MM. Juízo de primeiro grau.” (RO 01449-2005-100-15-00-4 TRT15)

“DOENÇA OCUPACIONAL — LAUDO PRODUZIDO POR FISIO-TERAPEUTA — NULIDADE. Na hipótese em que se discute a existência de doença ocupacional, a perícia deve ser realizada por médico, profissional habilitado e que possui o conhecimento técnico específico para a necessária anamnese e, sobretudo, para o diagnóstico acerca de eventual patologia.” (RO 0001417-25.2000.5. 15.0008 — TRT15)

“PERÍCIA. AFERIÇÃO DE DOENÇA PROFISSIONAL. FISIO-TERAPEUTA. INVALIDADE. No processo do trabalho, a perícia para apuração de doença profissional deve ser realizada, preferencialmente, por Médico do Trabalho, por aplicação do art. 195, caput, da CLT, e, onde não houver, por médico regularmente inscrito no órgão de classe, aplicando-se o art. 146, § 3º, do CPC. O profissional de fisioterapia não detém habilitação para realização de perícia com o objetivo de constatar doença profissional de LER/DORT e o respectivo nexo causal, pois esta profissão detém habilitação privativa para executar métodos e técnicas fisioterápicos com a finalidade de restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do paciente (art. 3º do Decreto-lei n. 938, de 13.10.1969).” (RO 948-2003-073-15-00-4 — TRT15)

“NOMEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA PARA AFERIÇÃO DE INCAPACIDADE LABORATIVA. IMPOSSIBILIDADE NA HIPÓTESE. LAUDO PERICIAL A SER REALIZADO POR MÉDICO, NA MEDIDA EM QUE O FISIOTERAPEUTA ESTÁ ADSTRITO À RECUPERAÇÃO DA CAPACIDADE FÍSICA DO PACIENTE, CABENDO AO MÉDICO O DIAGNÓSTICO PRÉVIO DA DOENÇA, TRATAMENTO E EM ESPECIAL O NEXO ETIO-LÓGICO ENTRE A PATOLOGIA E A ATIVIDADE LABORATIVA DO SEGURADO, REQUISITO NECESSÁRIO AO DESLINDE DA CONTROVÉRSIA NA ORIGEM. RECURSO PROVIDO NO PONTO. A perícia levada a efeito para avaliar o grau de incapacidade do trabalhador em virtude de lesão ou doença decorrente das atividades laborais, quando imprescindível ao deslinde da questão posta em juízo, deve ser realizada por médico profissional habilitado e não por fisioterapeuta.” (AI 392921 SC 2011.039292-1)

“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO JUDICIAL REALIZADO POR FISIOTERAPEUTA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. REALIZAÇÃO DE LAUDO JUDICIAL POR MÉDICO. 1. Acolhida a preliminar de nulidade da sentença, pois essa decisão teve por base laudo judicial realizado por fisioterapeuta, o qual não tem atribuição para a realização de diagnóstico médico. 2. Reabertura da instrução para a realização de laudo médico-judicial, no caso, por especialista em ortopedia.” (AC 9999 SC 0010514-87.2010.404.9999)


“PREVIDENCIÁRIO. PERÍCIA REALIZADA POR FISIOTERA-PEUTA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. Conforme precedentes desta Corte, dentre as atribuições do fisioterapeuta não se inclui a realização de diagnóstico médico, privativa de profissional da medicina, o qual é o indicado para a realização de perícia judicial em que se objetiva a verificação da incapacidade da parte autora. Sentença anulada para realização de perícia médica e regular prosse-guimento do feito.” (AC 9999 SC 0015490-40.2010.404.9999)

“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA ACOLHIDA. LAUDO JUDICIAL REALIZADO POR FISIOTERAPEUTA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. REALIZAÇÃO DE LAUDO JUDICIAL POR MÉDICO. 1. Acolhida a preliminar de nulidade da sentença, pois essa decisão teve por base laudo judicial realizado por fisioterapeuta, o qual não tem atribuição para a realização de diagnóstico médico. 2. Reabertura da instrução para a realização de laudo médico-judicial, no caso, por especialista em ortopedia.” (AC 9999 SC 0016166-85.2010.404.9999)

“Agravo de Instrumento. Previdenciário. Nomeação de Fisioterapeuta para a confecção de perícia. Inviabilidade. Exigência legal de profissional da Medicina. Recurso provido. A perícia levada a efeito para avaliar o grau de incapacidade do trabalhador em virtude de lesão ou doença decorrente das atividades laborais, quando imprescindível ao deslinde da questão posta em juízo, deve ser realizada por médico profissional habilitado e não por fisioterapeuta.” (AI 240155 SC 2010.024015-5)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLEITO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE NA INSTÂNCIA SINGULAR. NO-MEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA PARA EFETUAR A PERÍCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PROFISSIONAL QUE NÃO É COMPETENTE PARA EFETUAR DIAGNÓSTICO MÉDICO. NECESSIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PROFISSIONAL DO RAMO DA MEDICINA. RECURSO PROVIDO. A perícia levada a efeito para avaliar o grau de incapacidade do trabalhador em virtude de lesão ou doença decorrente das atividades laborais, quando imprescindível ao deslinde da questão posta em juízo, deve ser realizada por médico profissional habilitado e não por FISIO-TERAPEUTA.” (AI 432885 SC 2011.043288-5)

“ACIDENTE DE TRABALHO — PRELIMINAR DE NULIDADE DA PERÍCIA E DA SENTENÇA — PERITO FISIOTERAPEUTA — JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO TRIBUNAL SOBRE A NECESSIDADE DE A PERÍCIA SER REALIZADA POR MÉDICO — POSICIONAMENTO CONTRÁRIO DO RELATOR — ADESÃO AO ENTENDIMENTO DA MAIORIA PARA NÃO PREJUDICAR A SEGURANÇA JURÍDICA — ANULAÇÃO DO PROCESSO. No entendimento do Relator, pode o fisioterapeuta e o fonoaudiólogo realizar perícias em ações acidentárias, cada um na sua área de conhecimento, não sendo exclusivo de médico tal mister. Todavia, como a jurisprudência deste Tribunal é pacífica no sentido da necessidade de a perícia ser realizada por médico, adere-se a esse posicionamento para evitar prejuízo à segurança jurídica, anulando-se o processo desde a perícia, inclusive.” (AC 751637 SC 2011.075163-7)

“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. NOMEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA COMO PERITO OFICIAL. IMPUGNAÇÃO. INTERPRETAÇÃO LITERAL DO DECRETO N. 3.048/1999. PREVISÃO EXPRESSA DE QUE O EXAME MÉDICO-PERICIAL DEVE SER FEITO POR PROFISSIONAL DA ÁREA MÉDICA. RECURSO PROVIDO.” (AI 477271 SC 2010.047727-1)

“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE IN ITINERE. CONCESSÃO DE AUXÍLIO--DOENÇA NA INSTÂNCIA SINGULAR. NOMEAÇÃO DE FISIOTERAPEUTA PARA EFETUAR A PERÍCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PROFISSIONAL QUE NÃO É COMPETENTE PARA EFETUAR DIAGNÓSTICO MÉDICO. NECESSIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PROFISSIONAL DO RAMO DA MEDICINA. RECURSO E REMESSA PROVIDOS.” (AC 782797 SC 2011.078279-7)

À vontade para os sempre bem-vindos contraditórios.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha
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OBRIGADO!



XV Congresso Nacional da ANAMT – 15/05/2013.

Foto do lançamento da 3a Edição do meu livro: “Medicina do Trabalho e Perícias Médicas – Aspectos Práticos (e Polêmicos)” (Editora LTr).

Muito obrigado a todos que me prestigiaram, e adquiriram cada um dos 400 exemplares vendidos no evento!

Com o respeito de sempre, Marcos.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

TEMPO PARA ENTREGA DO ATESTADO?


Vídeo-aula sobre este assunto: http://www.youtube.com/watch?v=L7CNobxizX0



Prezados leitores.

Quando falamos em Direito, precisamos dividi-lo em: Direito Privado e Direito Público.

No que tange às relações de emprego no Direito Privado, as regras básicas estão contidas na CLT (Consolidações das Leis Trabalhistas). Sobre em qual tempo que o empregado deve levar o atestado médico à empresa, após recebê-lo do profissional de saúde de sua confiança, a CLT nada fala de forma expressa. Assim, cabe ao empregador arbitrar um tempo razoável para esse fim, e colocar isso da forma mais clara e indistinta possível no contrato de trabalho e/ou na ordem de serviço dada aos seus empregados.

De quanto pode ser esse tempo? Sugerimos um tempo que varie de 48 a 72 horas, após recebimento do atestado. Caso, em virtude de seu quadro clínico, o próprio empregado não possa fazer pessoalmente a entrega desse documento na empresa, que um responsável/representante o faça.

Por que determinar normativamente esse tempo, além da forma de entrega desse atestado? Lamentavelmente, muitos empregados ainda pensam, por exemplo, que, se receberem um atestado sugerindo 90 dias de afastamento, eles podem levar esse atestado à empresa somente após decorridos esses 90 dias, mesmo não tendo recebido nenhum benefício previdenciário durante todo esse tempo. Grande engano! Dependendo das condições clínicas do trabalhador, e considerando a hierarquia dos atestados prevista na Lei n. 605/1949, art. 6º, § 2º, o próprio serviço médico da empresa tem a competência legal de discordar do número de dias propostos no atestado. Nesse caso, o trabalhador que assumir o risco, e optar por levar esse documento na empresa somente após transcorridos os dias nele descritos, poderá não receber por esse tempo (caso o serviço médico da empresa entenda que eles não sejam necessários).

Ainda no exemplo do atestado de 90 dias, caso o empregado recebesse apenas 30 dias de benefício previdenciário (situação em que o Médico Perito do INSS tivesse discordado do emissor do atestado), e não voltasse à empresa nos 60 dias subsequentes confiando na eficácia do documento que está em seu poder, em casos extremos, essa atitude poderia configurar até “abandono de emprego”, nos termos da Súmula n. 32 do TST, que assim nos traz:

“Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.”

Por todo exposto, no Direito Privado, concluímos que a determinação expressa do tempo para entrega do atestado na empresa pelos trabalhadores, muito antes de ser uma arbitrariedade infundada do empregador, é uma atitude que visa à segurança jurídica, tanto para o empregado, quanto para o próprio empregador.

Já no Direito Público, as relações de trabalho, além da CLT, podem balizar-se por outras regras, por exemplo: pelos estatutos dos servidores públicos e pelos contratos de trabalho por tempo determinado. Nesses dois últimos casos, o Poder Público, em regra, faz constar nesses instrumentos o prazo para entrega dos atestados recebidos por seus servidores. Como exemplo, temos o Estatuto do Servidor Público de Florianópolis/SC, o qual assim coloca:

“Art. 44, § 3° O servidor, ou pessoa que por ele responda, enca-minhará atestado médico, no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas da data em que se iniciou o afastamento do serviço por motivo de doença, para obtenção do laudo da Junta Médica Oficial, na forma regulamentar.

Que Deus nos abençoe.

Um forte abraço a todos.

Marcos Henrique Mendanha
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Muito obrigado!

Marcos Henrique Mendanha.


quinta-feira, 2 de maio de 2013

PRONTUÁRIO: "SE CORRER O BICHO PEGA, SE FICAR O BICHO COME".


A questão da entrega do prontuário do paciente falecido para os parentes ou representante legal é um desassossego na vida dos médicos e hospitais. 

Isso porque o Judiciário e o CFM não se entendem, pois divergem nas decisões e entre ambas estão as pessoas acima mencionadas.

Enfoque legal

A Constituição Federal – CF, no seu art. 5º, inc. II, determina que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”. Esta é uma das premissas que deve ser observada para o estudo do caso.

E o que diz a lei? Primeiramente que o prontuário é documento único constituído de um conjunto de informações, sinais e imagens registradas, geradas a partir de fatos, acontecimentos e situações sobre a saúde do paciente e assistência a ele prestada e que tem caráter sigiloso (Resolução 1638/02 – Conselho Federal de Medicina – CFM).

A responsabilidade pela guarda do prontuário é da instituição de saúde ou do médico (art. 87, 2º, Código de Ética Médica – CEM), que devem observar o sigilo, haja vista o direito constitucional do paciente à inviolabilidade da sua intimidade, honra e imagem (art. 5º, X, CF). 

O mesmo CEM, art. 88, diz que é vedado ao médico negar ao paciente acesso ao seu prontuário e no art. 89 a vedação versa sobre liberação de cópias do prontuário sob sua guarda, saldo quando autorizado, por escrito, pelo paciente, para atender ordem judicial ou para a sua própria defesa e cujos procedimentos estão apresentados nos §§ 1º e 2º.

Isso porque ao médico é vedado revelar fato que tenha conhecimento em virtude da sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento do paciente, por escrito (art. 73, CEM). E essa vedação permanece mesmo que o paciente tenha falecido (parágrafo único), até porque o art. 154, do Código Penal caracteriza como crime esta revelação sem justa causa.

Dever legal, justo motivo, consentimento escrito do paciente

Pelo evento morte, impossível o consentimento escrito do paciente para a entrega da cópia do seu prontuário, a não ser que ele tenha autorizado anteriormente ao óbito.

O dever legal imposto pelo CFM demonstra justamente a não entrega da cópia. Há situações relativas a este dever que são exceções e impõem ao médico, por exemplo, revelar às autoridades sanitárias doença de notificação compulsória, mas esta não é a hipótese em debate.

Justo motivo ou justa causa é a argumentação mais utilizada, pois o parente que quer acesso às cópias alega a sua existência, por exemplo, por exigência da seguradora ou, simplesmente, por ser parente.

O CFM é taxativo ao afirmar que o direito ao sigilo do paciente vivo tem efeitos projetados para além da morte e que o justo motivo existe somente quando houver ordem judicial (processo-consulta CFM 4.384/07).

Recentemente o Tribunal de Justiça de São Paulo – TJ/SP – decidiu que o pedido da viúva para obter cópia do prontuário do marido falecido, com objetivo de entregar à seguradora constitui justo motivo, ou seja, deveria o hospital ter entregado administrativamente, sem a intervenção do Judiciário (Apelação 0049942-39.2011.8.26.0576).

Pedido com base no acima indicado (levantar seguro) e até mesmo avaliar a conduta médica-hospitalar com vistas à ação indenizatória, configura violação à intimidade do paciente ou mesmo do sigilo médico? Penso que não.

A situação é, em suma, a seguinte: se o médico entrega (inclusive diretores clínico e técnico) o prontuário do paciente morto ao seu parente, comete infração ética e poderá ser punido pelo Conselho Regional; se o médico não entrega, o parente terá que ingressar com ação judicial para este fim e, demonstrada a sua legitimidade (art. 12, Código Civil), terá sucesso no seu intento, ou seja, a cópia do prontuário deverá ser entregue.

Nesta hipótese, o médico se livra do processo e condenação ética, mas não se livra do pagamento dos honorários do advogado que terá que contratar para a sua defesa, bem como dos da parte adversa, pois será sucumbente na ação, além das custas e despesas processuais.

Neste sentido (TJ/SP, Apelação: 0016789-91.2010.8.26.0077) a jurisprudência abaixo, na qual figura o hospital no pólo passivo, mas que se aplica integralmente ao raciocínio ora apresentado:

“CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS – Recusa injustificada na apresentação extrajudicial de prontuário médico da própria apelada – Documento apresentado após a citação – ônus sucumbenciais devidos pelo Hospital que deu causa à demanda – Principio da causalidade – Sentença mantida. Recurso Improvido.”

Isso quando não tem o médico que impetrar habeas corpus para garantir o seu direito de ir e vir, quando insiste em cumprir as normas do CFM e não entregar cópia do prontuário, ainda que determinado pelo juiz ou requisitado pela autoridade policial, pois tal decisão do médico é passível de configurar crime de desobediência.

Ou seja, o médico e a instituição de saúde perdem de qualquer forma. Não seria o caso de repensar esta rigidez do CFM e alagar um pouco a caracterização da justa causa, logicamente com todas as cautelas necessárias para não dar margem à atuação dos mal intencionados? 

Importante que não se feche os olhos para esta realidade e soluções sejam buscadas para que a lei seja cumprida sem ônus para quem a cumpre (médico), que é o que acontece, pois a situação não é outra: “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”.

Verônica Cordeiro da Rocha Mesquita

Fonte: Saúde Web