A disseminação do uso das redes sociais e sua
presença intensa no cotidiano das pessoas se refletem, também, nas relações de
trabalho – e, consequentemente, começam a aparecer com mais frequência nos
processos que tramitam na Justiça do Trabalho (JT), se tornando objetos de
defesa ou acusação nas ações enviadas à JT.
Prova digital
De acordo com o advogado trabalhista Felipe
Serva, o perfil na rede social pode ser bastante útil numa ação trabalhista.
"Diante do nosso sistema processual, fato é que as informações disponibilizadas
pelos usuários nas redes têm ganhado espaço nos tribunais como meio de
prova", explica. O advogado afirma que, devido ao fácil acesso às
ferramentas da rede, o descuido nas publicações "tem relação direta com a
utilização por parte dos que se sentirem ofendidos em seus direitos de acionar
Judiciário".
Segundo o especialista, as redes sociais se
estabeleceram de tal forma na sociedade que as pessoas estão "revelando
mais do que deviam", o que pode ter reflexo tanto na vida pessoal, como na
profissional. "Postagens podem servir, ainda, como argumento para
dispensas por justa causa, caso o empregado resolva utilizar a rede para
críticas ou desabafos que comprometam a imagem da empresa ou ofendam o
empregador, ou até mesmo para demonstrar a desídia do empregado no horário e no
local de trabalho", conclui.
Justa causa
Em 2012, uma auxiliar administrativa da São
Paulo Transportes S.A. (SPTrans), empresa responsável por administrar o
transporte público do município, foi demitida por justa causa após publicar
críticas à Prefeitura Municipal de São Paulo no Facebook. Em desabafo, a
empregada chama o prefeito de safado e de "corruptos coronéis" os
indicados para ocupar os cargos na prefeitura.
Para a empresa, houve falta grave da
empregada devido ao conteúdo publicado. Insatisfeita com o motivo da dispensa,
ela acionou a SPTrans na Justiça do Trabalho, que entendeu que a crítica foi
direcionada ao governo municipal, e não à empresa, o que não configuraria
motivo para demissão motivada.
Má-fé
Em
outra ação na Justiça do Trabalho paulista, o Facebook serviu para comprovar
má-fé de um operador de mesa que faltou a uma das audiências na primeira
instância, em ação na qual buscava o reconhecimento de vínculo empregatício com
a empresa. Para justificar a falta à audiência de instrução e evitar a revelia,
ele apresentou atestado médico de dez dias de repouso domiciliar.
A
empresa, porém, apresentou cópias (prints) do perfil do operador na rede
social, comprovando que, naquela data, ele estava em um parque turístico em
Resende (RJ). A empresa teve o cuidado de autenticar as provas por ata
notarial, na qual o tabelião acessa o endereço da página e verifica a
veracidade das informações.
A 32ª
Vara do Trabalho de São Paulo aplicou pena de confissão e multa por litigância
de má-fé, mantida pelo TRT-SP e pelo TST.
(Adendo do blog sobre esse mesmo processo: "No
acordão, o juiz declarou: 'é nítido que ele não estava doente, uma vez que
estava alegremente bebendo com os amigos'", Além de ter perdido a ação,
que poderia ter lhe rendido cerca de R$ 300 mil, o funcionário foi condenado a
pagar uma multa no valor de R$ 3.000, por litigância de má-fé, e mais R$ 60 mil
para cobrir as despesas jurídicas que a empresa teve com o processo. A decisão
foi tomada pela 32ª VT de SP, mantida pelo TRT-SP e pelo TST”. Fonte: UOL,
19/01/2015.)
Vínculo
Em Santa Catarina, na tentativa de reverter
decisão que reconheceu o vínculo empregatício de um representante comercial,
uma empresa do ramo de informática apresentou como prova o perfil do profissional
no Twitter e no LinkedIn. A empresa defendia que alegou que mantinha relação de
representação comercial autônoma com o trabalhador, e alegou que, nas redes
sociais, ele se apresentava como representante comercial de outras empresas.
Apesar da tentativa, a Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo com base em
outros elementos de prova.
Acesso durante o expediente
Em 2008, em São Paulo, uma indústria
metalúrgica demitiu por justa causa um empregado que acessou o site de
relacionamentos Orkut durante o expediente, e armazenou no computador da
empresa foto do seu órgão genital. Segundo a empresa, o fato causou grande
repercussão no ambiente de trabalho, e a demissão foi motivada pelo
descumprimento de norma interna que proibia o acesso a sites de relacionamento.
Todavia, a Justiça do Trabalho entendeu que a
dispensa por justa causa foi excessiva, mesmo o trabalhador assumindo que
estava ciente da proibição. "Embora ingressar em site de relacionamento
possa constituir falta, não é grave suficientemente a ensejar, por uma única
ocasião, a rescisão por justa causa", registra o acórdão da Sétima Turma
do TST.
Trabalho e redes sociais
A especialista em redes sociais Talita
Scotto, diretora da Agência Contatto, empresa de gestão em comunicação de São
Paulo, explica que se tornou difícil para as empresas controlar o uso das redes
sociais por parte dos funcionários. "Acredito que limitar o acesso é
praticamente impossível, pois temos mais celulares do que habitantes",
afirma. "Boa parte da população acessa as redes sociais via móbile (celular),
e isso também acontece no trabalho".
Os números confirmam isso. Segundo dados do
Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação
(CETIC.br), órgão ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), o
número de brasileiros que usam internet via celular cresceu 106% entre 2011 a
2013, atingindo o número de 52,5 milhões de pessoas online via celular, o que
representa 31% da população do país.
Para Scotto, as redes também afetam o
rendimento dos negócios, "daí a preocupação com a difamação da imagem da
entidade". Segundo ela, devido ao grande acesso às redes sociais, muitas
empresas criaram um código de conduta para este fim. "As redes sociais
podem atrapalhar quando há excessos. A produtividade cai, o resultado não é
apresentado, o projeto atrasa." Nesse caso, explica, é necessária uma
advertência e uma avaliação sobre a necessidade ou não de desligamento do
empregado por problemas de produtividade. "Isso faz parte do bom senso e
responsabilidade de cada indivíduo e os limites devem ser respeitados",
conclui.
Título
original do texto: Objeto de defesa e acusação, redes sociais figuram em ações
na Justiça do Trabalho.