Prezados leitores.
Como ninguém, sei que o foco desse blog é a
discussão de temas relacionados à Medicina do Trabalho, e às Perícias Médicas. Excepcionalmente
hoje, me permitirei confabular sobre um assunto mais genérico, e não menos
importante: o “Ato Médico”.
Muito se tem falado sobre o projeto de lei
que regulamenta o “Ato Médico”. De lados
simetricamente opostos tenho visto árduos e apaixonados defensores, cada um com
sua bandeira, seu argumento, sua mágoa, seus afetos e desafetos. Ótimo! Toda
discussão é válida num ambiente democrático.
Nesse texto, não me proponho a (re)discutir
sobre a possibilidade de aprovação (ou não) do “Ato Médico”, muito menos sobre seu teor. Não! Longe disso. Aliás,
peço respeitosamente licença a todos os outros profissionais, e esclareço que
esse texto é dirigido exclusivamente aos meus colegas médicos.
Prezados colegas médicos: tenho observado um
elevado grau de expectativa em nossa classe no que tange às consequências de uma
eventual aprovação da Lei do Ato Médico. Com isso, tenho me perguntado: e se o “Ato Médico” fosse aprovado e
entrasse em vigor amanhã? O que mudaria? Quais conquistas nos seriam palpáveis
daqui a uma semana? O que poderíamos esperar do futuro da nossa profissão
médica?
Obviamente que como orgulhoso médico que sou,
minha esperança reside em dias melhores, em todos os aspectos da nossa
profissão. Gostaria de opinar com sincero otimismo nas respostas para as
perguntas que acabo de formular, mas infelizmente e racionalmente, não
consigo. Sei que não posso prever as consequências futuras da aprovação do “Ato
Médico”. Por outro lado, o passado é rico em nos mostrar a pouca aplicabilidade
das leis que defendem os médicos no Brasil, mesmo quando estas já estão
aprovadas, sancionadas e em vigor. Cito
como exemplo a Lei 3.999/1961. Essa
norma está em vigor há mais de 50 anos. Enalteço:
há mais de 50 anos! Vejamos alguns trechos dessa que é uma das mais
importantes leis para a profissão médica (especialmente para os que são contratados na iniciativa privada):
Art. 8º. A duração normal do
trabalho, salvo acordo escrito que não fira de modo algum o disposto no artigo
12, será:
a) para médicos, no mínimo de duas
horas e no máximo de quatro horas diárias;
§ 1º Para cada noventa minutos de
trabalho gozará o médico de um repouso de dez minutos.
§ 2º Aos médicos e auxiliares que
contratarem com mais de um empregador, é vedado o trabalho além de seis horas
diárias.
§ 3º Mediante acordo escrito, ou por
motivo de força maior, poderá ser o horário normal acrescido de horas
suplementares, em número não excedente de duas.
§ 4º A remuneração da hora
suplementar não será nunca inferior a 25% (vinte e cinco por cento) à da hora
normal.
Nota:
a Constituição de 1988 atribuiu que o valor da hora suplementar não será nunca
inferior a 50% (cinquenta por cento) a mais do que o valor da hora normal, o que requer uma leitura
contextualizada desse parágrafo.
Art. 9º. O trabalho noturno terá remuneração
superior à do diurno e, para esse efeito, sua remuneração terá um acréscimo de 20% (vinte por cento), pelo menos,
sobre a hora diurna.
Art. 15. Os cargos ou funções de chefias de serviços médicos somente
poderão ser exercidos por médicos, devidamente habilitados na forma da lei.
Art. 21. São automaticamente nulos todos os contratos de trabalho que,
de qualquer forma, visem a elidir a presente lei.
Mais uma vez ratifico: essa lei está em vigor! E já faz mais de 50 anos!
Meus queridos colegas: quantos dos Senhores
tiveram em seus cursos de medicina pelo menos uma aula específica sobre a
presente lei? Quantos dos Senhores já foram conclamados a lutar pela efetivação
dessa norma, em qualquer momento dos últimos 50 anos? Qual a porcentagem de
aplicabilidade real dessa legislação no cotidiano dos médicos brasileiros em
atuação? Tristes respostas...
É por essas e outras que estou convencido, mesmo com imensa vontade de estar profundamente
enganado, que se o “Ato Médico” for aprovado e sancionado amanhã, na realidade, nada (ou na
melhor das hipóteses, muito pouca coisa) muda. Mas quem sabe eu
esteja equivocado?! Como médico (e com todo respeito aos discordantes), torço pela
aprovação do “Ato Médico”. Mas torço bem mais pela sua efetivação, afinal, “de
leis que nada significam” já estamos fartos...
Vamos com fé, meus colegas! Mas é sempre bom lembrar, parafraseando Gabriel - O Pensador, "não adianta olhar pro céu com muita fé e pouca luta..."
Um forte abraço a todos.
Que Deus nos abençoe.
Marcos Henrique Mendanha
E-mail: marcos@asmetro.com.br
Twitter: @marcoshmendanha
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