No Brasil, os conflitos
trabalhistas atingem números espantosos. Segundo o relatório do Conselho
Nacional de Justiça, tramitaram na Justiça do Trabalho, em 2012, cerca de 7
milhões de processos, sendo 3,8 milhões de casos novos e 3,2 milhões de casos
antigos.
Nos últimos anos, tem
crescido o número de juízes e de funcionários, assim como o orçamento da
Justiça do Trabalho. Em 2012, o total de servidores aumentou 15%, a maioria de
concursados e efetivos, o que revela bom nível de qualificação. O número de juízes
também cresceu não apenas na Justiça do Trabalho, mas de modo geral.
O Brasil tem oito juízes
por 100 mil habitantes e está acima da média internacional. A produtividade dos
magistrados vem aumentando nos últimos anos. E a carga de trabalho de todo o quadro
de pessoal da Poder Judiciário é reconhecidamente pesada. Afinal, se há
funcionários e juízes capazes e se todos trabalham muito e com produtividade
crescente, qual é o problema?
No caso da Justiça do
Trabalho, ocorre que, a cada ano, o número de processos aumenta mais do que o
quadro de pessoal e da sua produtividade. Nos últimos tempos, a produtividade
cresceu cerca de 3% ao ano (o que é admirável), mas o número de processos novos
aumentou 6%, somando-se a eles um acúmulo histórico que entope todos os
tribunais.
A causa da explosão de
processos no Brasil não deve ser atribuída ao pessoal do Poder Judiciário.
Parte do aumento de ações trabalhistas decorre de empregadores que descumprem a
lei. Mas a principal causa está no extremo detalhismo e na moldura gigantesca e
complexa do nosso quadro legal. A Constituição Federal tem 67 dispositivos no
campo trabalhista com adicional de 14 regras transitórias. A Consolidação
das Leis do Trabalho incorpora quase mil artigos, desdobrados em centenas
de parágrafos e incisos. Os Códigos Civil e Penal têm dezenas de dispositivos
no campo do trabalho.
O Tribunal Superior do
Trabalho já editou mais de 400 atos jurisprudenciais. O Ministério do Trabalho
e Emprego e o Ministério da Previdência Social possuem uma imensidão de regras
detalhadas e precedentes administrativos que aumentam a cada dia. O Ministério
Público do Trabalho igualmente tem inúmeras exigências. No campo internacional,
são 82 as Convenções da OIT ratificadas e em vigência no país.
Com tamanha complexidade,
o sistema processual da Justiça do Trabalho é verdadeiro convite ao litígio.
Quanto mais detalhes, maior é a probabilidade de impasses. Mas isso não é tudo.
Outra fonte de ações decorre do fato de que entrar com uma ação na Justiça do
Trabalho não gera nenhum risco para o autor -- só tem vantagem.
Então, por que não
arriscar? As chances de obter alguma coisa na audiência inicial são grandes,
pois cerca de 50% das disputas se resolvem nessa fase com o pagamento de
montantes atraentes e sem custas para quem moveu a ação. Mas, a esse ponto, o
processo já gerou despesas de grande vulto para o erário e muito desgaste
emocional para as partes. É difícil saber a quem esse sistema está servindo.
Mais uma fonte de ações
está no fato de o Brasil não valorizar as formas alternativas de resolução de
conflitos. Entre nós, o único direito que tem valor é o que está na lei, e a
única solução que atende os anseios dos litigantes é a judicial. Isso é
cultural. Na cabeça dos brasileiros, os bons direitos são os assegurados por
lei, não por contratos -- e a boa solução vem da Justiça, não da conciliação,
mediação ou arbitragem. Esses expedientes, tão valorizados nos países
avançados, são praticamente desprezados entre nós.
Não há remédio de efeito
instantâneo para o excesso de ações. A cura dependerá de um conjunto de
medidas. A primeira é valorizar e fortalecer os mecanismos alternativos de
resolução de conflitos. A segunda, estabelecer algum risco (sucumbência) para
quem insistir em entrar na Justiça antes de usar aqueles mecanismos. A
terceira, prestigiar e fortalecer a negociação coletiva, eliminando-se de uma
vez por todas a interferência do Poder Judiciário nos acordos e convenções
coletivas. O excesso de intervenção funciona como um desestímulo à negociação e
convite à busca de solução por meio da Justiça do Trabalho.
O Brasil não crescerá o
quanto pode enquanto não reduzir de maneira drástica a insegurança jurídica e o
alto custo (econômico e psicológico) das ações judiciais. Dados recentes
apontam que as empresas gastam cerca de R$ 110 bilhões por ano com litígios
judiciais. A União despende mais R$ 35 bilhões com o Poder Judiciário, dos
quais R$ 15 bilhões só com a Justiça do Trabalho (orçamento de 2014). Além
disso, há as despesas dos reclamantes que, afinal, aturam a demora e sofrem os
desgastes de longo calvário. Esse quadro precisa mudar.
Autores do texto:
José Pastore
Professor de relações do trabalho da Universidade de São Paulo e
presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio-SP.
José Eduardo G. Pastore
Advogado trabalhista e mestre em direito social.
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