Prezados
leitores.
Mais uma
disputa presidencial se avizinha. Gosto muito de acompanhar a dinâmica
eleitoral desse momento e procuro fazer isso da forma mais isenta possível. Já
votei em candidatos do PT, do PSDB, e também de outros partidos (e que atire a
primeira pedra quem nunca cometeu pecado!). Vejo defeitos e virtudes em todos eles
(talvez, bem mais defeitos do que virtudes). Enfim, minha torcida é pelo
Brasil.
Dito isso,
me sinto à vontade e isento para fazer uma breve reflexão sobre um tema super
espinhoso e que deu origem a esse texto: Aécio e o “Mais Médicos”. Trata-se
de uma opinião personalíssima, sempre passiva de toda discordância. Vamos lá.
Me recordo
da primeira vez que ouvi a presidenta Dilma falar sobre o “Mais Médicos”. Foi
no dia 22/06/2013 em um pronunciamento de radio e TV. Na época, o Brasil
assistia a uma mobilização nacional de protestos que nos fez aparecer nos
noticiários do mundo todo. O país incendiava. Naquele dia, disse a presidenta: “vamos trazer de imediato milhares de médicos do exterior para ampliar o
atendimento do sistema único de saúde, o SUS.” Confesso que o termo que
mais me impressionou no dizer da mandatária-mor
do Brasil foi o “de imediato”.
Explico o “por que” no próximo parágrafo.
Até então, para
atuar como médico no Brasil o profissional precisava atender somente o art. 17
da Lei 3.268/57. Segundo ele, o profissional necessita ter diploma em Medicina reconhecido
pelo MEC e estar registrado em algum CRM para o pleno exercício da profissão
médica. Apenas isso! Mas como então a presidenta iria trazer “de imediato” milhares de médicos? Eles
certamente não teriam diplomas convalidados, reconhecidos pelo MEC de forma
imediata. Também por isso, não seriam registrados nos CRMs de forma imediata. Então
como os traria? Contrariando a lei? Pois bem... “é aí que entra o poder da
caneta”.
O Palácio do
Planalto, bem orientado juridicamente que é, ao expressar o termo “de imediato” referia-se a Medida
Provisória (MP) n. 621 feita pela presidente Dilma logo nos dias seguintes, e
publicada no dia 08/07/2013 (16 dias depois do pronunciamento de radio e TV). Quando
a MP é publicada ela já tem força de lei e por isso deve ser obedecida por
todos imediatamente. Conforme essa MP, “a
declaração de participação no Projeto Mais Médicos para o Brasil, fornecida
pela coordenação do programa, é condição necessária e suficiente para expedição do registro provisório pelos CRMs, não
sendo aplicável o art.17 da Lei 3.268/57”. Pronto! Nesse momento o “de imediato” dito pela presidente
passou a ser legal e factível. É o que se diz nos bastidores dos altos poderes: “se o que queremos é ilegal, que se crie
uma norma que o torne legal.” E assim foi feito.
No entanto,
como sabemos, toda MP precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional para que
continue sua eficácia. Nesse momento, enquanto ela não era votada, me lembro
que alguns presidenciáveis se posicionaram contra o “Mais Médicos” e favoráveis
ao movimento médico brasileiro, que naquele momento se levantava fortemente
contra o programa presidencial. No entanto, pouco tempo depois esses mesmos presidenciáveis
mudaram de ideia. Por que? Pois em setembro de 2013 (já próximo da MP ser
votada), uma pesquisa encomendada pela Confederação Nacional de Transportes
(CNT) mostrou que 73,9% da população aprovava o “Mais Médicos”. Alguns dirão
que os que votaram nessa pesquisa não possuíam entendimento e educação
suficientes para avaliar com profundidade o programa. Mas isso não importa! São
votos e eles não podem ser desprezados. Pra quem não entendeu até hoje, no Brasil
é assim que funciona.
Fato é, que
desde então, nenhum político ou presidenciável se posicionou em redes de comunicação
de massa de forma contrária ao “Mais Médicos”, que virou plataforma eleitoral de todos os candidatos, e não apenas dos candidatos petistas. Fato é, que logo após a pesquisa, a MP do programa se
tornou lei (aprovada pelo Congresso Nacional com maioria de votos favoráveis de deputados e senadores da situação e da oposição). Trata-se da Lei 12.871 de
22/10/2013 – data de um mês após a publicação da pesquisa da CNT. Fato é, que o
candidato que ousar falar mal do “Mais Médicos” vai perder voto, e por isso,
certamente nenhum presidenciável falará ou se declarará publicamente contra o programa.
Dentro dessa linha, vejamos o que o pré-candidato Aécio Neves disse sobre o
assunto, em 20/05/2014:
(UOL pergunta para Aécio) “O programa Mais Médicos será
mantido?”
(Aécio responde) “O programa Mais Médicos é um programa,
vamos chamar, circunstancial, temporal. Nós temos que enfrentar a questão da
saúde de forma mais orgânica, de forma mais ampla. Você sabe que nesses três
últimos anos apenas o governo do PT permitiu que 13 mil leitos hospitalares
fossem extintos, fechados no Brasil, [digo isso] apenas para contrabalancear um
pouco esse discurso do Mais Médicos. O que eu defendo é mais saúde. Nós
defendemos progressivamente o aumento da participação do governo federal no financiamento
da saúde, que diminuiu em 10% praticamente no período do governo do PT. Eram
54% [em relação a todos investimentos na saúde pública no Brasil] quando eles
assumiram o governo e hoje é alguma coisa em torno de 45%. A nossa proposta é de
que [esse investimento] possa chegar a 10% [de todo orçamento do governo]. O
Mais Médicos continuará, mas nós não faremos a discriminação do que hoje o
governo federal faz em relação aos médicos cubanos. Na nossa avaliação eles
devem ter os mesmos direitos e ter a mesma remuneração de outros médicos de
outras partes do mundo. Não justifica o Brasil se submeter a uma legislação de
uma entidade internacional latinoamericana, que por sua vez segue a legislação
cubana. Não tem sentido. Isso mostra a fragilização do Brasil. Mas não é só
isso. Nós temos que nos preocupar em criar mais vagas nas escolas de medicina
espalhadas pelo Brasil, e elas vieram diminuindo ao longo desse ano. O governo
do PT não percebeu que elas vinham diminuindo. Eu acho que é importante que nós
defendamos uma carreira para os médicos, uma carreira federal. Acho que isso é importante
para permitir que eles [médicos] alcancem esses grotões. Nós estamos com um
grupo de pessoas extremamente qualificadas discutindo a segunda etapa do
programa Mais Médicos. O Mais Médicos não é a solução para os problemas de
saúde brasileiros.”
Que “sinuca
de bico”, hein Aécio?! Não pode ser contra o “Mais Médicos” porque irá
contrariar muitos eleitores. Ao mesmo tempo, não pode ser a favor de Cuba (grande
fonte de material humano para o programa) porque também vai contrariar
eleitores e se mostrar contraditório e incoerente no que tem dito sobre países
como Cuba e Venezuela. Precisa falar em aumentar o número de médicos brasileiros (até errando ao justificar que o número de vagas em faculdades de medicina diminuiu no governo do PT... pelo contrário, "nunca na história desse país" subiu tanto). Não pode ser contra os médicos brasileiros, pois irá
perder votos desse importante segmento (tão carente de alguém que verdadeiramente
os represente). O que fazer então? Tentar não se comprometer agora, tangenciar
(mas nunca aprofundar) no assunto. Quando perguntado especificamente sobre o
tema “Mais Médicos”, defender a mudança do termo para “Mais Saúde” e já discorrer
logo sobre o descaso com o financiamento do SUS (algo que aliás se perpetua
entre todos os governos), alterando o foco da pergunta. Enfim, para qualquer
presidenciável bem assessorado que pretenda tirar a reeleição da atual
mandatária, essas e outras sabonetadas (“escorregadas, quiabadas, fugidas, etc.”)
são ótimas estratégias nesses 4 meses que antecedem as eleições. E assim tem
feito o senador mineiro. E assim fará qualquer outro potencial presidenciável. E
é assim que provavelmente faríamos se fôssemos presidenciáveis e quiséssemos de
fato ser eleitos e ao mesmo tempo criticar de alguma forma o modelo atual.
Resumindo: o
que acontecerá de verdade com o “Mais Médicos” se o Senador Aécio Neves for
eleito? Mesmo com a continuidade do programa, se a lógica se mantiver, o material humano do programa se tornará mais escasso
devido a uma diminuição natural dos relacionamentos entre Brasil e Cuba, o que
sinaliza para uma maior valorização da medicina brasileira (considerando também que médicos de outros países não mostraram entusiasmo em vir trabalhar aqui, mesmo com o advento do programa). Mas em política existe
alguma lógica? Façam suas apostas.
Por um
Brasil melhor, reflitamos sem paixão.
Marcos
Henrique Mendanha
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