quarta-feira, 2 de outubro de 2013

INDICAÇÃO MÉDICA OU DESVIO DE FUNÇÃO? DEPENDE DO INTERESSE DE QUEM TÁ VENDO.

EMENTA: “READAPTAÇÃO FUNCIONAL. NECESSIDADE RECONHECIDA POR PARECER MÉDICO. CONFIGURAÇÃO. Não se afigura razoável que, mesmo após expressa indicação médica, a reclamada tenha insistido em manter a reclamante no mesmo setor de trabalho, local em que, sabidamente, não estava conseguindo exercer suas atribuições de forma satisfatória. Se não bastasse, a própria reclamada, em audiência, manifestou sua concordância com a readaptação da reclamante no setor de Pré-Medidos, na forma determinada pelo MM. Juízo a quo em sede de antecipação de tutela (fl. 288).Portanto, está-se diante de um autêntico caso de preclusão lógica do poder de recorrer, consubstanciada na aceitação da decisão, aplicando-se ao caso o disposto no art. 503 do CPC. Recurso a que se nega provimento.”

A 5ª Câmara do TRT-15 negou provimento a recurso do Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo (Ipem), mantendo intacta sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho (VT) de São José dos Campos, que condenou a autarquia a manter a reclamante em função compatível com a sua enfermidade, enquanto esta perdurar, sob pena de pagamento de multa diária no valor de mil reais.

A reclamada, em sua defesa, alegou que "tomava todas as medidas necessárias para a readaptação da função da autora". Disse também que "sempre foi zelosa com o cumprimento de seus deveres e atenta e sensível aos problemas de saúde relatados pela reclamante, de maneira que seria desnecessária a busca da tutela jurisdicional pela reclamante, pois todas as medidas necessárias à sua readaptação já estavam sendo adotadas".

No entanto, o relator do acórdão da 5ª Câmara, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, entendeu diferente. Para ele, "não há cogitar de ausência de interesse de agir quando, ao menos em tese, a parte necessita vir a Juízo a fim de obter a tutela de um interesse material que alega não ter sido atendido pela parte adversa".

A reclamante informou que é portadora de Síndrome de Fibromialgia – Classificação Internacional de Doenças (CID) M79-0 –, com comprometimento de sua capacidade laboral, e por isso pediu ao Departamento de Recursos Humanos da autarquia reclamada sua readaptação no Setor de Pré-Medidos, que trata dos produtos cuja quantidade é determinada sem que o consumidor acompanhe o processo de medição (mercadorias geralmente acondicionadas em algum tipo de embalagem, a qual traz no rótulo, obrigatoriamente, a quantidade de produto nela contida). 

A trabalhadora contou também que, apesar de ter sido reconhecida a necessidade de readaptação por parecer médico, nenhuma providência concreta foi tomada no sentido de se proceder a efetiva readaptação. Por isso, não viu outra forma senão buscar na Justiça do Trabalho a tutela antecipada com vistas à sua imediata readaptação.

A reclamada se defendeu, afirmando que, "atenta aos exames e à existência de restrição quanto à prática de esforços repetitivos por parte da autora, e tendo conhecimento dos problemas de saúde relatados desde maio de 2010, atendeu ao pleito da reclamante, readaptando-a no Setor de Verificação Periódica".

O acórdão ressaltou, porém, que, apesar da recomendação médica de readaptação da reclamante no Setor de Pré-Medidos, como "local propício", a reclamada tentou readaptar a reclamante no própria setor em que esta já vinha exercendo suas atividades habituais, acolhendo, assim, recomendação do delegado de Ação Regional de São José dos Campos, que, "em resposta a pedidos de informações do assessor-chefe da Superintendência da autarquia reclamada, indicou o Setor de Verificação Periódica como o local mais adequado para o desempenho das atividades laborais da reclamante, levantando óbices à readaptação desta no Setor de Pré-Medidos, por considerar que nesse setor são realizadas atividades que demandam maior esforço físico, o que poderia agravar o já debilitado estado de saúde da autora", salientou.

Contudo, a Câmara entendeu que "não se afigura razoável que, mesmo após expressa indicação médica, a reclamada tenha insistido em manter a reclamante no Setor de Verificação Periódica, local em que, sabidamente, ela não estava conseguindo exercer suas atribuições de forma satisfatória". 

O colegiado observou ainda que, "se não bastasse, a própria reclamada, em audiência, manifestou sua concordância com a readaptação da reclamante no Setor de Pré-Medidos, na forma determinada pelo Juízo ‘a quo′ em sede de antecipação de tutela".

A Câmara afirmou que o caso se apresenta como de "preclusão lógica do poder de recorrer", uma vez que a própria empresa aceitou a decisão. Por isso, esclareceu o acórdão, aplica-se ao caso o artigo 503 do Código de Processo Civil, segundo o qual "a parte que aceitar expressa ou tacitamente a sentença ou a decisão não poderá recorrer".

Em conclusão, o acórdão reputou "correta a decisão de origem ao acolher a pretensão da autora" e determinou que fosse feita a readaptação da trabalhadora no Setor de Pré-Medidos, sob pena de pagamento de multa diária. 

Processo 0001768-95.2011.5.15.0045 RO – Reexame Necessário. 


Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 15ª Região Campinas

2 comentários:

  1. Olá Dr. Marcos, já tive a oportunidade de assistir o seu curso sobre as polêmicas entre o Médico do Trabalho e o Médico Perito. Na ocasião lhe apresentei a mesma questão que volta a indagar, diante de tal texto: No caso de empresa pública, o fato de alterar a função do empregado não fere o previsto na Constituição, Art. 37, o qual trata do impedimento de transposição de carreria a não ser por meio de CONCURSO PÚBLICO.
    A empresa que trabalho, que é pública, não reabilita os empregados a não ser quando passam pelo processo de CRP - Reabilitação Profissional previsto pela Previdência Social. Estes empregados retornam com um certificado para a alteração da função. Temos muitos casos de empregados que apresentam relatórios dos médicos assistentes tratando da necessidade de readaptção, mas a política atual da empresa repassa esa demanda oa INSS que às vezes acata e encaminha o mesmo para o CRP, mas há muitas situações que não acatam, ou ainda só o fazem após muitas perícias, ocasionando período sem benefício ao empregado que já se encontra sem salário. Corremos o risco agindo dessa forma? Desde já agradeço as orientações propostas neste blog, que são extremamente importante e esclarecedoras.
    MARTA HELENA JARANDIA - SP

    ResponderExcluir
  2. Importante considerar o direito da pessoa humana: - Aqueles que por fator de influência sobre sua saúde, perde a capacidade laborativa original, se indicada a Readaptação Profissional, se aplica em seu benefício o conceito de Deficiência Física. Deste modo, a Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU (CDPD), tratado internacional de direitos humanos, do qual o Brasil é signatário, tem efeitos na hierarquia legal vigente, notadamente nas normas infraconstitucionais incompatíveis. Tal Convenção trata a habilitação e reabilitação profissional, no artigo 26, e lá se indica que devem ser tomadas providências para possibilitar que as pessoas com deficiência conquistem e conservem o máximo de autonomia e plena capacidade física, mental, social e profissional, bem como plena inclusão e participação em todos os aspectos da vida. Avança, na questão do emprego e trabalho, apontando que devem ser organizados e implementadas medidas para se atingir ao objetivo de manter a pessoa que adquiriu uma deficiência o direito de continuar no trabalho (art. 27, item 1), mediante a promoção da reabilitação profissional, e a manutenção do emprego e dos programas de retorno ao trabalho para pessoas com deficiência (art. 27, item 1, k). Portanto, o “direito de continuar no trabalho” e “direito de retorno ao trabalho”, é direito fundamental para a pessoa com deficiência, haja vista que é o esteio para a independência do cidadão. Portanto, não há outra forma de se entender a questão de forma contemporânea, além daquela em que o Concurso Público habilita a Cargo Público. O readaptado continua no Cargo Público, portanto, não havendo desvio de função, por ser seu direito constitucional, lhe cabe disponibilização de função que lhe seja compatível.

    ResponderExcluir

Os comentários só serão publicados após prévia análise do moderador deste blog (obs.: comentários anônimos não serão publicados em nenhuma hipótese).